Em
dois textos Dietrich Bonhoeffer (1906-1945) expõe seu conceito
fundamental sobre aquilo que é realmente importante para o serviço
litúrgico da igreja e para o cristão no mundo: Discipulado
(publicado iniciantemente em 1937 – em alemão: Nachfolge)
e Ética
(obra que não chegou a ser concluída).
Inicialmente,
preciso destacar que a percepção de
Bonhoeffer vai além de apenas uma vida de devoção pessoal
exclusiva, a vida litúrgica do cristão e da igreja no mundo deve
partir do contato sagrado com o Jesus encarnado e crucificado para se
transformar em ações concretas que façam diferença na sociedade.
Foi neste direcionamento ele escreveu sua teologia opondo dois
conceitos a partir do tema da graça como peça fundamental do
universo doutrinário cristão: a graça barata e a graça preciosa.
Por graça barata, Bonhoeffer entende como sendo aquele
sentimento de relaxamento cristão por se acreditar que em se obter a
graça divina isto nada implica na vida cotidiana do cristão.
Afirma ainda que este tipo de concepção da graça é fruto de um
culto do literalismo que prega um perdão sem
arrependimento e um batismo sem disciplina. Esta graça
não faz diferença na vida do cristão e, por isto mesmo, não faz
nenhuma diferença na atuação da igreja no mundo.
Do outro lado está o conceito de graça preciosa, por ter
custado a Deus a vida de seu Filho. Esta graça exige disciplina
de um comprometimento exclusivo com a pessoa de Jesus Cristo.
Ou seja, a vida litúrgica do cristão e da igreja tem que ser de um
comprometimento ético disciplinado que indique o reflexo de um
seguir a Jesus Cristo.
Para Bonhoeffer, este conceito de ética deveria ser a expressão
exata de experiência de Cristo. Na vida do Jesus encarnado,
crucificado e ressurreto está toda demonstração do engajamento
cristão que se espera do discípulo.
Na ética do discipulado, que implica seguir a Jesus, está expresso
também um dos conceitos mais caros para a teologia de Bonhoeffer: a
relação entre o último e o penúltimo. O último
é, e sempre deverá ser, o evento justificador da parte de Deus. A
palavra justificadora de Deus jamais abandona sua posição de última
palavra.
É no processo de justificação oriundo da graça de Deus que o ser
humano atinge o seu fim último, fim este em relação ao qual tudo o
mais se torna transitório e penúltimo. Daí que a liturgia
disciplinada do cristão deve ser sempre na direção e na intenção
do último através da concretização de penúltimos.
Nas palavras do próprio Bonhoeffer: Derradeiro
e penúltimo estão intimamente ligados. Cabe aqui, pois, reforçar
o penúltimo através de uma pregação mais enfática do derradeiro,
bem como proteger o derradeiro através da preservação do
penúltimo.
Mas, ainda refletindo na obra sobre o discipulado, depois de
compreender sobre os conceitos de graça e suas implicações,
Bonhoeffer apresenta um estudo sobre o Sermão da Montanha para
compreender que a Comunhão dos Santos não é a comunhão ideal
de pessoas isentas de pecado e perfeitas (…). Ao contrário,
é a comunhão que se mostra digna do Evangelho do perdão.
Ou seja: A
disciplina permeia toda a vida da Igreja. Nela existe uma ordem de
sequência fundamentada no serviço da misericórdia. A origem de
qualquer prática disciplinar é a pregação da Palavra de acordo
com as duas chaves. Ela não se restringe à reunião litúrgica,
porquanto o oficiante, em nenhuma circunstância, está licenciado de
sua missão. “Prega a palavra, insta, quer seja oportuno, quer
não, corrige, repreende, exorta como toda longanimidade e doutrina.”
(2 Tm 4.2) Esse é o início da disciplina eclesiástica.
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