sexta-feira, 16 de novembro de 2012

MISTERIOSO CANTO ORIENTAL


Dou sagrada atenção à música litúrgica do oriente.  Mesmo fora do ambiente eclesiástico, há um toque de mistério na tradição dos cantos da igreja cristã oriental.  Pode ser em grego bizantino ou moderno, russo, armênio ou copta – a língua pouco importa, já que não domino nenhuma delas.  Mas algo me cativa no misterioso canto ortodoxo oriental.
Em tudo, aquele canto difere do que meus ouvidos foram forçados a ouvir no dia-a-dia: melodia, ritmo e harmonia não se encaixam nos padrões da cultura pop de hoje (nem gospel!).  Sinto, contudo, uma estranha familiaridade com a rica herança que cristãos do oriente legaram à fé e à cultura ocidental. 
Com tais músicas, sei que faço parte deste rio caudaloso que nasceu nas estepes da Palestina entre discípulos e apóstolos, avolumou-se com os pais da igreja e ainda banha meu cristianismo hoje.
Ouvi-los cantando é deixar-se ser inundado por uma atmosfera de piedosa tradição e mistério cristão que, sem dúvida, são tão fundamentais a minha alma quanto o ar para meus pulmões.  Sem eles, minha religiosidade maquia-se em apenas ativismo cansativo e árido e o cristianismo míngua como um fardo a ser descartado pelo ocidente pós-moderno (pós-cristão!).
Assim, o canto das igrejas do oriente me conduz de volta às fontes.
Tradição e piedade santas afloram com o canto dos irmãos ortodoxos.  Ao som de tais orações, como verdadeira adoração, ressoa o desafio da busca por uma religião que seja mais que eventos e produza uma saudade salpicada de esperança, atualizando a própria tradição e anunciando que no Cristo que encontro no culto há calma, paz e sossego para minha alma.
O misterioso canto oriental infunde e acentua a fé que me vem de tempos imemoriais, evoca o sentimento de pertença junto a irmãos e irmãs que, com suas vidas e fé, descortinaram a revelação do amor divino para seus prediletos. 
Ora, sem mistério, religião e crença – qualquer que seja ela – não passam de rituais de sombras em cavernas (o velho Platão já sugeria algo assim).  E, também por isso, os antigos cantos instigam minha mente e alma a contemplar e se abrir ao mistério revelado no encarnado.
Vivendo num ocidente cultural que já não se reconhece nos detalhes da herança cristã – então nem o valoriza – e, por isso mesmo, sente-se como uma sociedade órfã, deslocada, caolha e amorfa; parar um tempo para ser tocado pelo misterioso canto oriental é se ver como o filho pródigo chegando novamente na velha casa e inexplicável e graciosamente ser mais uma vez abraçado pelo Pai.
Enquanto pipocam dance music, rock, hip hop, funk ou outros sons eletrônicos (gospel ou não!) em nossas novas igrejas, faltam o gosto e o cheiro do antigo e profundo mistério do evangelho.  Não fique sedento na beira da fonte das águas: beba ainda do misterioso canto oriental.  Δόξα στο Θεό.

(Lá em cima, interior da Catedral de Santa Sofia na Turquia, imagem recolhida no site http://www.ecclesia.com.br)

7 comentários:

  1. Compartilhei o o texto no facebook e o sentimento nele expresso.

    Parabéns!

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    1. Valeu, amigo. É bom saber que não estamos sós.
      A glória seja a Deus.
      Um abraço

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  2. Pr. Jabes Graça e Paz!!!

    Muito legal seu artigo sobre o canto oriental. Eu particularmente sinto falta de estudos sobre a mistica teológica oriental. Enquanto nós, evangélicos, lançamos fora as liturgias e as heranças da história cristã por causa de uma romanofobia, a ponto de jogar fora a agua da banheira com a criança dentro, os nossos irmãos orientais conseguiram manter claras distinções do que é sagrado e o que é profano (Creio que perdemos muito disso, a ponto de basta ter os nomes Deus e Jesus já é musica pra crente ouvir, não importando a baboseira teológica contida na letra. Nossas músicas causam inumeras sensações, da agitação ao delírio coletivo mas poucas auxiliam numa reflexão genuína sobre o caráter de Nosso Criador e de Sua adoração. Os orientais mantem a belíssima experiência da contemplação, o que se perdeu entre nós em meio a agitação desse mundo tecnológico. Toda mística ortodoxa ajuda a levar a este estado contemplativo, e creio que o crente ao realizar essa jornada transcendental e também interior do "examine-se pois o homem a si mesmo" compreende melhor o que é ser piedoso. Graça e Shalom pastor. Até a próxima.
    Jáfer Gomes Ferreira

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    1. Querido Jafer.
      Boas suas palavras. Há realmente uma riqueza na liturgia e na mística oriental cristã que nos conduz à contemplação e à reflexão. Se conseguirmos restaurar esta herança muito contribuiremos com o aprofundamento da fé cristã em nossas igreja.
      Um abraço.

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    2. Querido Pastor Jabes.

      Acredito que seja possível, mediante um bom estudo, uma certa restauração dessa herança. Lendo mesmo os mestres do Ocidente como Agostinho, Tomás de Aquino e Francisco de Assis, pude sentir o Poder de Deus que age na História. Muitas vezes, nós leigos, nos deixamos levar pela visão errônea que após o Concílio Niceno e o inicio da Idade Média a Igreja foi só caos e corrupção, como se Deus não usasse mais ninguém, como se tivesse tirado férias do seu posto de Soberano, e só com Huss, Wicliff e Lutero, séculos depois, voltasse a agir. Esquecemos que tinha muita gente boa trabalhando para o Reino dentro de suas limitações, tanto na Igreja Romana como nos grupos discidêntes e nas igrejas orientais. Pensando na questão de resgate, como pastor toda essa riqueza poderá ser transmitida ao crente comum que aparentemente não se importa com isso? Para muitos isso parece elevado demais e tratam com leviandade todo nosso legado eclesiástico. Tenho um amigo e irmão em Cristo que estuda esta temática que pode ajudar com material caso o senhor creia ser oportuno. O nome dele é Erike Couto. É graduando em letras gregas pela UFMG, fala fluentemente hebraico, aramaico, estuda árabe e copta, além de saber ler a escrita hieroglífica, hierática e demótica. Conhece um pouco de siríaco também. É um apaixonado por línguas antigas e vive cercado de textos antigos da Cristandade além de conhecer muito bem a tradição judaica. Estudamos juntos trechos do Talmud, do Sefer HaZohar, e a Mishná. Se o Senhor quiser posso falar com ele ou passar o endereço eletronico dele para o senhor. Material traduzido direto da fonte ele tem de sobra. Abraços.

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    3. Querido,
      Mais uma vez, são oportunas suas colocações. Sobre homens de fé que povoaram a igreja ao longo da jornada, sugiro a leitura do livro de Leloup & Boff: "Terapeutas do Deserto".
      Um abraço

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  3. Graça e Paz pastor!

    Muito obrigado pela indicação, vou procurar o livro sem demora.
    Abraços.

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