Aproveitei uns dias de folga no
final do ano para atualizar a leitura.
Na minha biblioteca caseira sempre há alguns volumes que acrescento ao
longo da caminhada e que por razões diversas vão sendo preteridos. Assim foi com o texto de Max Lucado: "Graça". Não lembro exatamente quando ele chegou, mas
nunca foi lido, até este fim-de-ano. Assim,
eu o peguei e li quase de uma tomada só.
O tema em si já é naturalmente
empolgante: A GRAÇA. Entre as
declarações que embasaram a Reforma Protestante nos séculos XVI e XVII uma
delas afirmava: sola gratia – somente
a graça. A nossa fé e toda a nossa
formulação cristã estão firme e profundamente alicerçadas na crença que somente
a graça divina, manifesta em Cristo, conforme relatada nas páginas sagradas, é
o que pode aliviar o peso que sobrecarrega nossa alma e pode nos abrir os
portais eternos de volta à casa Paterna.
E assim Lucado começa a
descrevê-la: A graça é a melhor ideia de
Deus. O pecado e a culpa sempre pesam sobre nós,
corroendo nossa vida e a transformando numa antecipação do inferno. Esse é o problema central da humanidade. E é exatamente para resolver tal problema que
a graça se manifestou em Cristo Jesus. E
nesta equação entre pecado, culpa, castigo e amor divino é que a graça se
manifesta. Como colocar tudo isso numa
mesma fórmula? Lucado assim resolve:
Deus não ignorou seus pecados, para que não suceda que
concorde com eles. Ele não puniu você,
para que não suceda dele destruir você.
Em vez disso, ele encontrou uma maneira de punir o pecado e preservar o
pecador. Jesus assumiu sua punição e
Deus deu a você o crédito pela perfeição de Jesus.
E então é por conta desta ideia
maravilhosa que Lucado chega à conclusão de seu livro com a seguinte proposta:
Deixe-o fazer o trabalho dele. Deixe que a graça triunfe sobre sua história
de prisão, crítica e consciência culpada.
Veja a si mesmo pelo que você é – projeto pessoal de reconstrução de
Deus.
Então, voltando ao meu roteiro de
leituras de fim-de-ano, resolvi ler mais uma vez o texto de Philip Yancey sobre
o mesmo tema. O título em inglês é What's So Amazing About Grace? (em português:
Maravilhosa Graça). Em geral, raramente leio mais de uma vez
qualquer título literário, mas com certeza o texto de Yancey merece releituras. E aproveitei o embalo do trabalho de Lucado
para voltar às suas páginas.
É certo que o próprio Yancey se
reconhece nos seguintes termos:
Para dizer a verdade, mal provei da graça em toda a
sua intensidade, tenho dispensado menos do que recebi e não sou, de modo
nenhum, um especialista no assunto.
Mas ao se propor a apoiar-se mais
em histórias do que em silogismos preferindo transmitir graça em vez de
explicá-la, entendo que ele foi não somente feliz em expor este conceito
fundamental ao cristianismo (penso no duplo sentido da expressão fundamental), como também relevante em
abordar temas nevrálgicos em nosso sistema de crenças e eclesiologia.
Narrando histórias da ficção,
fatos pessoais e outros de conhecimento público, Yancey apresenta um quadro onde
o escândalo da graça esbofeteia nossa falsa segurança religiosa e nos desafia
ao aceitamento incondicional daquilo que somente Cristo pode realizar a partir
de seu sacrifício único.
E os temas delicados se sucedem:
alegria, severidade, correção, piedade, imperfeição, perdão. Mas também
assuntos concretos com os quais precisamos lidar – e nem sempre a igreja sabe o
que fazer com eles: racismo, holocausto, fundamentalismo, homossexualismo,
álcool, vícios, corrupção, adultério, política.
Temas que carecem de ser olhados com o devido prisma que somente a graça
pode nos fornecer.
E Yancey nos coloca incomodamente
alguns desses desafios. Denuncia uma fé
cristã que se cristalizou ao longo de eras excluindo do seu cerne a preciosa
graça e deixou com que a não-graça dominasse o mundo no qual vivemos – mesmo no
chamado ocidente cristão. Veja suas
palavras:
A fé religiosa – com todos os seus problemas, apesar
de sua enlouquecedora tendência para copiar a não-graça – sobrevive porque
sentimos a beleza luminosa do dom imerecido que vem em momentos inesperados de
fora. Recusando-nos a crer que nossas
vidas de culpa e vergonha não nos levam a nada a não ser à aniquilação,
esperamos, sem nenhuma esperança, um outro lugar dirigido por regras
diferentes. Crescemos famintos de amor
e, de maneira tão profunda que não conseguimos expressar, ansiamos por que o
nosso Criador nos ame.
Então é tal graça que nos parece
por vezes incoerente, absurda, injusta – e somente ela – que nos leva a Deus e nos ensina que Deus nos ama pelo que Ele é, e não pelo
que nós somos. Categorias de merecimento
não valem nada. E nada há que eu possa fazer que produza amor
maior ou aceitação da parte de Deus, da mesma forma que nenhuma atitude minha –
ou falta dela – que afaste a graça de mim.
Deus simplesmente me ama em Cristo Jesus, e isso basta.
É por isso que Yancey insiste em
que a igreja seja aquilo para a qual foi idealizada: que a igreja se torne uma cultura nutridora dessa
graça.
Excelente texto, pois traz uma reflexão sobre a não graça no comportamento de religiosos. Que a graça ocupe lugar e prevaleça! Abraços, professor!
ResponderExcluirAmém querido.
ExcluirA graça é o que nos atrai para Cristo e o que nos sustenta. Que ela sempre possa suplanta a fina religiosidade de comportamentos aparentes.
Abr.