sexta-feira, 30 de novembro de 2012

É PROIBIDO PENSAR


Ouvi a música É Proibido Pensar pela primeira vez já faz alguns anos em um clip na Internet.  O compositor: João Alexandre, nunca tive a oportunidade de conhecê-lo pessoalmente.  Na semana passada, fuçando numa livraria evangélica aqui em Aracaju, achei o CD e entendi que deveria ter uma cópia em casa – além do que, tendo a pretensão de sempre escrever bons textos é preciso ler e ouvir coisa de qualidade.
A gravação (segundo a ficha técnica, feita entre julho e setembro de 2007), com doze faixas – todas interpretadas em voz e violão –, traz músicas e letras do próprio João Alexandre junto a outras peças, e são exatamente as composições que nos chamam a atenção.
O CD abre a primeira faixa com a canção intitulada Na Tua Presença, seguida do Credo Apostólico – uma verdadeira coragem adaptar a declaração de fé dos pais.  Ao contrário do que possa parecer, não ficou pedante nem soou anacrônico.  É bom saber que ainda cremos naquilo que nossos antepassados nos legaram.
Seguem-se Te Vejo Poeta que apresenta a cruz vulgar como a obra máxima da poesia divina e Anjos lembrando-nos destes seres que nos ajudam na caminhada e conosco se unem em canções de louvor.
Arruma a cangalha na cacunda...  é assim que começa a faixa cinco: Feirante.  Conheci esta música ouvindo o CD e, preciso confessar, vi-me surpreendido com a descrição do cotidiano simples, direta, gostosa, sem desconsiderar a dureza da vida mas lembrando da quitanda da esperança onde se pode achar sonhos de açúcar mascavo.
Depois: Paz e Comunhão, a faixa seis.
Então temos a música tema do disco: É Proibido Pensar.  Uma excelente mistura de crítica, ironia e advertência, temperada com uma boa pitada de lucidez e comprometimento com o evangelho puro.  Aqui merecem citação as palavras do encarte: "ser cristão é simplesmente ser, sem rótulos nem modismos, sem máscaras nem títulos, muito menos negociações com o céu!"
Ouço depois a bela canção Pai Nosso, uma fantástica adaptação da oração modelo do Mestre.  Lembro-me que meu cunhado a interpretou na minha cerimônia de casamento.  Sempre é bom ouvi-la novamente, para refazê-la como uma prece.
Há ainda o hino tradicional Que Segurança de F.J. Crosby, o que só faz enriquecer o conjunto da obra, com seu refrão: "Canta minh'alma! Canta ao Senhor! Rende-lhe sempre ardente louvor!"
Três músicas completam a gravação: Trabalho Esperança (faixa 10), Vou Pescar (fixa 11) e O Que Bem Quiseres (faixa 12).
E creio que é indispensável concluir esta resenha glorificando ao Senhor da igreja por ter ele concedido o dom de poeta a alguns dos seus servos para que eles possam abastecer a dispensa santa com tais pérolas. 

terça-feira, 27 de novembro de 2012

DA RENÚNCIA


Mais um tema é apresentado na interpretação completa que Jesus faz da Lei do Deus no AT. Em Mt 5:38-42 o tema apresentado é a vingança.  Se aos antigos foi autorizado algum ato de retribuição, Jesus agora afirma que a verdadeira retribuição do discípulo radical é a não resistência.
Acompanhe o encadeamento da radicalidade do discipulado.  A primeira implicação do que Jesus tem a dizer é que aquele que se dispõe a seguir a Jesus tem que, deliberadamente, renunciar a qualquer direito que imagina ter.  A minha vida e os meus direitos estão mortos no discipulado porque para mim o viver é Cristo, e o morrer é lucro (Fl 1:21).
Desta renúncia me vem a realidade de que a minha vida já foi exposta e entregue na cruz de Cristo e nela está depositada toda a minha atual existência.  Sem esta entrega na cruz não há vitória para o discípulo.  Sem a autonegação da cruz não há vida. É sério o que Paulo declara aos romanos: “Ora, se morremos com Cristo, cremos que também com ele viveremos” (Rm 6:8). 
Uma última implicação das palavras de Jesus também pode ser lidas ainda em Paulo: “Não se deixem vencer pelo mal, mas vençam o mal com o bem” (Rm 12:21).  Renunciar o direito à vingança e à retribuição do mal sofrido não é admitir a derrota do cristão diante das forças malignas deste mundo, mas é enfrentá-las com uma força ainda maior: o mal vence o bem não lhe confrontando mas lhe sobrepujando.
Que eu, tendo sido já chamado ao discipulado, me entregue completamente ao caminho da renúncia da cruz para que alcance a vitória final em Cristo Jesus, para sua glória.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

O PECADO, O SANGUE E O PERDÃO


“De fato, segundo a Lei, quase todas as coisas são purificadas com sangue, e sem derramamento de sangue não há perdão” (Hb 9:22).
Na Bíblia, os conceitos de pecado sempre estão associados ao de morte e separação.  Assim é que o pecado gera a morte (Rm 6:23) e faz separação entre Deus e os homens (Ef 2:14).  Por outro lado, o tema do sangue está também intimamente ligado à vida e à união (confira os mesmos textos).
Ora, é certo que todos os homens e mulheres estão em pecado – o que gerou para nós morte e separação, carência e necessidade de Deus e de perdão.  Como pecadores estamos na possibilidade real e constante da morte por estarmos separados de Deus – que é a fonte da vida, e separados uns dos outros.  E tem mais: como a culpa do pecado exige reparação e "sem derramamento de sangue não há perdão" (Hb 9:22) então a nossa culpa de sangue perante Deus seria impagável.  A morte e separação são inevitáveis.
Mas o texto nos fala que no sangue de Cristo nossa dívida foi total e finalmente paga diante de Deus.  Na cruz que derramou o sangue de Cristo há vida e reconciliação entre a criatura caída no pecado e o Criador em sua santidade.  Cristo nos trouxe para perto de Deus – que nos mantém em vida aqui e no além, e também nos proporcionou uma verdadeira aproximação entre nós seus filhos – agora em Cristo somos um.
Realmente, o sangue de Cristo é o motivo de nossa celebração, ele nos traz vida e proximidade.  Vamos fazer de nossos encontros na Casa de Deus verdadeiros festivais de celebração do sangue de Cristo.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

DA HONRA E DA VERDADE




Vocês também ouviram o que foi dito aos seus antepassados: não jurem falsamente... (Mt 5:33).  Jesus continua reinterpretando a Lei dada por Deus aos antigos, aplicando-a ao coração e a vida dos seus discípulos.  O tema agora é a verdade.
Nos Dez Mandamentos está preceituado: “Não dirás falso testemunho” (Êx 20:16).  O que a Lei quer preservar aqui é o valor da honra e da verdade.  Por conta da possibilidade da mentira, os antigos garantiam suas palavras chamando Deus por testemunha – o juramento (Dt 6:13).  Assim o juramento atestava os ditos em relação ao passado e garantia os votos futuros.
Agora Jesus exige dos seus discípulos uma postura de verdade radical: sim, sim; não, não (Mt 5:37).  Nada menos que toda a palavra do servo de Cristo deve ser verdadeira; desta forma, o cristão não tem necessidade de atestar as suas palavras, tomando Deus como testemunha no juramento.  A mentira (filha do diabo como é dito em Jo 8:44) já deve ter sido extirpada de minha vida pelo poder que emana da cruz de Cristo, logo posso tomar posse de toda a verdade e viver baseado nela.
A pergunta é inevitável: Mas como viver assim?  A resposta tem que também ser radical: lendo a Bíblia reconheço duas respostas. a) em relação ao passado, tenho o auxílio do Espírito Santo que faz lembrar fielmente da Palavra de Deus (Jo 14:26), logo não preciso atestar mais minhas palavras pois o Espírito em mim já o faz em todos os momentos; e b) quanto ao futuro, como ele para mim permanece incerto, a instrução é que toda garantia dos planos futuros seja colocada no Senhor (Tg 4:15).  Assim não preciso jurar, pois Deus fará o que bem quiser da minha vida.
Certo de que o próprio Deus me fará, pela sua graça e poder, viver um discipulado verdadeiro.  Que eu me dedique àquele que é a própria verdade – Jesus (Jo 14:6) para sua glória.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

MISTERIOSO CANTO ORIENTAL


Dou sagrada atenção à música litúrgica do oriente.  Mesmo fora do ambiente eclesiástico, há um toque de mistério na tradição dos cantos da igreja cristã oriental.  Pode ser em grego bizantino ou moderno, russo, armênio ou copta – a língua pouco importa, já que não domino nenhuma delas.  Mas algo me cativa no misterioso canto ortodoxo oriental.
Em tudo, aquele canto difere do que meus ouvidos foram forçados a ouvir no dia-a-dia: melodia, ritmo e harmonia não se encaixam nos padrões da cultura pop de hoje (nem gospel!).  Sinto, contudo, uma estranha familiaridade com a rica herança que cristãos do oriente legaram à fé e à cultura ocidental. 
Com tais músicas, sei que faço parte deste rio caudaloso que nasceu nas estepes da Palestina entre discípulos e apóstolos, avolumou-se com os pais da igreja e ainda banha meu cristianismo hoje.
Ouvi-los cantando é deixar-se ser inundado por uma atmosfera de piedosa tradição e mistério cristão que, sem dúvida, são tão fundamentais a minha alma quanto o ar para meus pulmões.  Sem eles, minha religiosidade maquia-se em apenas ativismo cansativo e árido e o cristianismo míngua como um fardo a ser descartado pelo ocidente pós-moderno (pós-cristão!).
Assim, o canto das igrejas do oriente me conduz de volta às fontes.
Tradição e piedade santas afloram com o canto dos irmãos ortodoxos.  Ao som de tais orações, como verdadeira adoração, ressoa o desafio da busca por uma religião que seja mais que eventos e produza uma saudade salpicada de esperança, atualizando a própria tradição e anunciando que no Cristo que encontro no culto há calma, paz e sossego para minha alma.
O misterioso canto oriental infunde e acentua a fé que me vem de tempos imemoriais, evoca o sentimento de pertença junto a irmãos e irmãs que, com suas vidas e fé, descortinaram a revelação do amor divino para seus prediletos. 
Ora, sem mistério, religião e crença – qualquer que seja ela – não passam de rituais de sombras em cavernas (o velho Platão já sugeria algo assim).  E, também por isso, os antigos cantos instigam minha mente e alma a contemplar e se abrir ao mistério revelado no encarnado.
Vivendo num ocidente cultural que já não se reconhece nos detalhes da herança cristã – então nem o valoriza – e, por isso mesmo, sente-se como uma sociedade órfã, deslocada, caolha e amorfa; parar um tempo para ser tocado pelo misterioso canto oriental é se ver como o filho pródigo chegando novamente na velha casa e inexplicável e graciosamente ser mais uma vez abraçado pelo Pai.
Enquanto pipocam dance music, rock, hip hop, funk ou outros sons eletrônicos (gospel ou não!) em nossas novas igrejas, faltam o gosto e o cheiro do antigo e profundo mistério do evangelho.  Não fique sedento na beira da fonte das águas: beba ainda do misterioso canto oriental.  Δόξα στο Θεό.

(Lá em cima, interior da Catedral de Santa Sofia na Turquia, imagem recolhida no site http://www.ecclesia.com.br)

terça-feira, 13 de novembro de 2012

DO DESEJO SANTO




O segundo tema reinterpretado por Jesus é o tema do adultério (Mt 5:27-32).  Aqui vale o mesmo princípio interpretativo.  Jesus não vem abolir a Lei, mas cumpri-la e levá-la a seu real significado e extensão.
Aos antigos foi dito: “Não adulterarás” (Êx 20:14).  Neste sétimo mandamento Deus apresenta o alto valor dado à família, a pureza e a santidade.  Deus criou o homem e a mulher com suas diferenças e seus desejos.  E os fez assim para serem santos e puros na sua vida aqui nesta terra.  É isto que Deus intenta preservar neste mandamento.
Qualquer que olhar para uma mulher e desejá-la... (Mt 5:28).  Jesus vai além do ato conjugal em si.  Todo o corpo, mente e intenções têm de ser consagrados ao Mestre, logo não podem se desviar, tornando-se impuros em nada, nem desviando de sua intenção original.  Os desejos do discípulo podem ser santos (leia Hb 13:4) ou podem ser impuros, obstruindo a visão do Reino de Deus.  Se o coração do discípulo se enche de desejos vãos, então não poderá desejar a pureza que vem do Mestre.
E Jesus vai mais além: se tiver que escolher entre um objeto de desejo transitório e a fonte suprema de todo bem – que se faça a escolha pelo eterno em detrimento do passageiro.  O Mestre oferece aos seus discípulos gozo perene.  Mas é preciso não trocá-lo por prazeres banais!
Ainda tratando do desejo, Jesus o canaliza para o matrimônio que só deve ser celebrado em amor.  E isto é fácil de compreender.  Para o discípulo, qualquer vinculo ou compromisso somente será celebrado se for embasado em amor (confira Cl 3:14), pois qualquer outro vínculo que haja entre cristãos, será abandono do discipulado. 
Considerando o Amor de Cristo, razão de ser do discipulado, que eu possa dedicar ao Mestre meus desejos santos.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

CARGA TORTA



Na tarefa de observar o mundo em minha volta e procurar refleti-lo a partir de um olhar bíblico-cristão sempre se há de encontrar pontes entre o cotidiano e a revelação (não é novidade que faço isso por vocação e com alegria, então nunca é curioso demais perceber que com um pouco de criatividade teológica tais pontes se sobressaem na névoa das ideias fluentes).
Um dia destes, voltando a Aracaju, avistei um caminhão transportando uma carga completamente torta (a foto está aí do lado para comprovar o flagrante).  Quem viaja pelas estradas de nosso Brasil sabe que é possível se ver de tudo por estes caminhos.
A viagem naturalmente continuou.  Os olhos se deixavam percorrer as paisagens e a mente (esta maravilhosa dádiva do Criador) foi-se vasculhando fragmentos de conceitos e textos por vezes colocados na estante do intelecto mas que precisam ser retocados com frequência para continuaram vivos.
E a imagem foi se compondo: aquela carga torta muito bem poderia me representar.  Viajando na estrada da vida não é raro me sentir empenado com o peso que carrego.  Mas, por que isto acontece?  Como resolver isso para continuar a caminhada?  Bem, aí depende...
Não parei para vistoriar o caminhão e a sua carga torta, mas não é difícil deduzir que pelo menos uma ou duas causas provocaram aquela situação.  E se olhar direito, também estas causas me deixam bem torto na minha jornada.
A primeira hipótese é que a carga do caminhão excedesse o total suportado pela máquina e suspensão – ou que estivesse pelo menos mal arrumada em cima da carroceria.  Todo veículo é projetado para funcionar até um limite.  Além daí a coisa entorta.  Talvez fosse o caso...
Minha vida também foi projetada para ter um limite de peso e por vezes o stress, a ansiedade, a agenda lotada, os dramas e traumas acumulados sobrecarregam minha alma e ela entorta.  Viver assim é um risco.  Então eu me lembro do Cristo que me convida a trocar minha carga torta e pesada pela sua suave e leve (a citação é de Mt 11:28-30, mas outros textos podem ser lembrados como 1Pe 5:7 e Mt 6:31).
Mas o problema do caminhão poderia não ser apenas de excesso de peso.  Não se deve descartar a possibilidade de uma falha estrutural ou mecânica.  Aí a situação ficaria mais séria.  Quando há uma quebra na suspensão, qualquer carga, até o peso na própria estrutura deixa todo o caminhão torto.  Neste caso é preciso parar para consertar...
Continuo me enxergando na situação.  Quando minhas decisões e vida forçam minha estrutura, ela se rompe (às vezes de maneira disfarçada como um pecado camuflado).  Também aqui a situação fica mais séria, pois quebrado por dentro tenho que ir a oficina para consertar o que quebrou.  E com a alma estragada vou a oficina divina na confiança de que ele mesmo haverá de fazer novas todas as coisas (promessa de Ap 21:5 – mas considere também 2Co 5:17).
Sei que não dá para prosseguir na viagem da vida com a carga torta, por isso recorro com confiança sempre àquele como comigo viaja até o dia da glória (não se esqueça de Mt 28:20) para poder continuar. 
E você, como vai levando sua carga?

terça-feira, 6 de novembro de 2012

DO VALOR DA VIDA HUMANA




Nestas reflexões sobre discipulado radical, voltemos agora para o projeto de Jesus apresentado por Mateus.  A partir do verso 5:21, Mateus apresenta a nova interpretação que Jesus faz da Lei.  Neste texto Jesus destaca cinco temas primordiais para fazer uma leitura interpretativa daquilo que a Lei do AT diz, levando-a ao seu real significado: Homicídio – adultério – juramento – vingança – amor ao próximo.  “Vocês ouviram o que foi dito...” – “... mas eu lhes digo...” é a fórmula usada pelo Mestre para mostrar tanto a sua autoridade sobre a Lei quanto a sua autoridade em interpretá-la.
Aos antigos foi dito: “Não matarás” (Êx 20:13).  Neste mandamento Deus quer demonstrar o valor absoluto da vida humana por ser a imagem de Deus.  Jesus não nega o valor dado ao ser humano: pelo contrário, reafirma que Deus dar valor máximo ao ser humano (veja Mt 6:26 – ainda vou tratar do tema nesta série de reflexões).  É por isto que o Mestre agora se põe a ampliar os ditames da Lei.
Se na Lei antiga a integridade vital e física humana é garantida, Jesus procura garantir a integridade moral, intelectual e espiritual.  Ele amplia a Lei prescrevendo que o discípulo não pode se irar contra seu irmão.  Muito mais que apenas uma ação contundente contra alguém que o leva a ferir ou morrer, Jesus Cristo classifica como pecado – estará sujeito a julgamento (Mt 5:22) – a ação intencional que vise ferir ou desonrar o próximo.
Diante desta nova interpretação, o próprio Jesus instrui aos seus discípulos a entrar em acordo com o adversário enquanto é tempo (veja o verso 5:25).  O que é dito aqui é que o discípulo deve sempre tomar a iniciativa de buscar o irmão para propor reconciliação.  Fazendo isto o discípulo estaria dando valor ao próximo como o próprio Deus o dá.
Reconhecendo a autoridade de Jesus sobre a Lei, devo procurar meus irmãos para como eles estabelecer relacionamentos cristãos saudáveis.