terça-feira, 8 de novembro de 2022

CORBAN E O PRINCÍPIO DA ABRANGÊNCIA

 


Na contestação que Jesus fez da interpretação da Lei dada por fariseus e homens religiosos de seu tempo e de como as tradições tinham modificado o sentido real dos Mandamentos divinos, o Mestre apontou para uma questão central: tanto as leis morais quando as leis rituais antigas foram dadas por Deus, mas cada uma deveria ter seu enfoque e abrangência – isso que eu aqui chamo de o princípio da abrangência.

No episódio que estou tomando como referência (Mc 7), os fariseus tinham questionado Jesus sobre os hábitos de pureza ritual praticado pelos discípulos e, como resposta, Jesus aproveitou para criticar o argumento fariseu da Corban que, segundo eles, daria direito ao fiel de negligenciar os devereis sociais e familiares se fosse para cumprir um voto a Deus.

Assim então, de acordo com esse posicionamento fariseu, leis e rituais cerimoniais antigos moldados segundo a tradição própria, teriam o mesmo valor sagrado diante de Deus que as Leis morais e espirituais que regulavam a essência do relacionamento divino-humano – bem como o humano-humano.

Vamos entender melhor esse princípio da abrangência. 

Embora as leis cerimoniais tenham sido dadas por Deus aos antigos durante sua constituição – isso é inegável – elas deveriam cumprir apenas um papel ritual de configuração de “como” se fazer determinadas abordagens de culto e cerimônia e não serem o “fundamento” da celebração e culto em si.

Ou seja, a essência estava no fundamento do relacionamento santo entre Deus e seres humanos – entre o que deveria ser cultuado e seus servos cultuantes – e não nos ritos de aproximação e coreografia do culto.

E para piorar, a esse conjunto de ritos instituídos por Deus, à tradição os judeus agregaram uma série quase intermináveis de pequenos penduricalhos legais que apenas sobrecarregavam o fiel sem nada acrescentar em santidade e relacionamento sincero com Deus.

Essa era o Corban alegado pelos fariseus, como conjunto de leis e tradições que atalhavam seus ofícios religiosos e sociais.

Jesus se opôs veementemente contra tudo isso.  Regras e tradições religiosas poderiam até ser eventualmente boas – o próprio Deus se ocupou delas – mais nunca tiveram a abrangência suficiente para trazer de volta homens e mulheres para a comunhão com o Senhor.  E esse sempre foi o objetivo das Leis dadas por Deus aos antigos.

E nesse mesmo sentido de interpretação legal contida na crítica de Jesus estava também a advertência sobre a preocupação de manter a pureza exterior – visível aos homens – e descuidar do interior puro – que é visto por Deus.  Jesus chamou isso de hipocrisia ritual de adoração (confira as duras palavras em Mt 23:25-27).

O ritual tem apenas uma abrangência exterior e, por isso, pouco proveito espiritual (Paulo também se referiu a essa ideia em 1Tm 4:8), enquanto um coração quebrantado é sempre acolhido por Deus (leia o Sl 51:17).

O Corban e os ritos e disciplinas espirituais não são ruins em si, mas têm uma abrangência limitada quando se tem por meta o encontro verdadeiro e santo com o Senhor.

Que possamos focar nossa vida e experiências espirituais não apenas nos sinais e ritos exteriores de santidade, mas naquilo que realmente é abrangente o suficiente para nos aproximar de Deus.

Nas palavras do próprio Jesus:

 

‒ Bem-aventurados os que são limpos de coração, porque serão esses que verão a Deus.
(Mt 5:8)

 

§ Leia toda a série de reflexões que escrevi sobre o tema do Corban – baseada na passagem de Mc 7.   

 

+ CORBAN – JESUS E OS RELIGIOSOSlink

+ CORBAN E O PRINCÍPIO DA AUTORIDADElink

+ CORBAN E O PRINCÍPIO DA COERÊNCIAlink

+ CORBAN E O PRINCÍPIO DA COMPAIXÃOlink

+ CORBAN E O PRINCÍPIO DA INTENCIONALIDADElink

 

§ Se quiser ainda estudar mais sobre o termo Corban, eu fiz uma pequena análise exegética e ofereço no link:

 

+ CORBAN – SANCTUM DONUM DEI link

 

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