terça-feira, 12 de abril de 2016

O PROTESTANTISMO BRASILEIRO – Uma classificação teológica

Qualquer observação, por mais superficial e desinteressada que seja há de constatar que não há uma homogeneidade completa entre grupos cristãos não-católicos brasileiros, os quais aqui chamamos simplesmente de protestantes.  Suas múltiplas origens sociocultural e histórico-teológico não permitiriam tal homogeneidade, contudo se pode notar que há traços característicos que perpassam todos os grupos e que se mostram como bons referenciais teóricos para se compreender como se configuram as diversas tonalidades do protestantismo brasileiro.
Teologicamente, talvez a melhor classificação unificadora dos diversos grupos protestantes brasileiros seja: tradicionais e pentecostais, ambos com suas ramificações internas.  Observemos que nesta classificação inicial, os grupos protestantes de migração não se configuram como um grupo em separado mas, quando não se apresentam apenas como distintivo étnico,  este protestantismo de migração no Brasil pode ser enquadrado na classificação acima.
O protestantismo de missão que chegou ao Brasil em meados do século XIX é herdeiro direto dos movimento avivalistas americanos.  Antônio Gouvêa Mendonça observa que “sob o ponto de vista formal, congregacionais, presbiterianos, metodistas e batistas, transplantaram para o Brasil o protestantismo típico norte-americano”, ou seja: se por um lado mantiveram a estrutura eclesiológica original, por outro, continua Mendonça: “a relativa uniformidade teológica dos 'avivamentos' e da 'era metodista' do protestantismo americano foi mantida”.  Além destes grupos citados que se mostram como os grandes representantes da ala chamada de protestantismo tradicional brasileiro, outros grupos de protestantes de migração acabaram adotando a mesma teologia e práticas.  Passados estes anos de implantação do protestantismo de missão no Brasil esta relativa unidade teológica dos grupos que compõem o principal substrato do protestantismo tradicional permanece com pouquíssimas variações, de modo que a análise atual não difere muito da original destes grupos.
Quanto a sua teologia, o protestantismo tido como tradicional no Brasil, já na sua herança e mais ainda hoje, é nitidamente arminiano – mesmo os grupos de origem calvinista mais forte como os presbiterianos e batistas – enfatizando tanto a ação divina no ser humano, mas principalmente a resposta deste à palavra divina.  A soteriologia baseia-se na resposta consciente do indivíduo a um chamado emocional que ocorre no momento da conversão, fazendo dele uma nova criatura.  Convém ressaltar que o protestantismo tradicional brasileiro, mantendo-se fiel às suas origens reformadas, que advogam uma fé racionalizada, e origens avivalistas, que propagam a experiência mística como selo da fé, vem alternando entre uma e outra ênfase na tentativa de equacioná-las, porém sem nunca se imiscuir inteiramente no contexto brasileiro.
Do outro lado, os pentecostais que mesmo sendo bem mais recentes, só chegaram já no século XX, apresentaram um crescimento tão vertiginoso e uma singularidade teológica e litúrgica que merecem a classificação em separado dentro do protestantismo brasileiro.  Mas o pentecostalismo brasileiro não é de todo um movimento uniforme e aqui podemos subdividi-lo em dois grupos distintos que chamaremos de pentecostalismo original, ou primitivo, e neopentecostalismo, ou pós-pentecostalismo,  para seguir a sugestão de Paulo Siepeirski.
Seguindo a indicação proposta por R.G. Rodrigues, as origens pentecostais já estavam embutidas nos próprios movimentos avivalistas norte-americanos, daí que as ênfases teológicas serem no geral as mesmas encontradas no protestantismo tradicional no Brasil.  As principais diferenças entre ambos, segundo listou Luiz Sayão, é que os pentecostais – carismáticos na sua linguagem – pregam que “só é possível ter uma vida cristã plena depois de se receber o batismo no Espírito Santo” e que, “ao contrário das igrejas tradicionais, os novos grupos acreditam estar praticando constantemente os chamados dons carismáticos”, e ressaltamos aqui principalmente o falar em línguas, ou glossolalia.  Outras diferenças são apresentadas porém com menor grau de importância.
Os grupos pós-pentecostais por sua vez, vão diferenciar basicamente em dois pontos da Teologia do pentecostalismo original.  Quanto a Escatologia, que abandonarão a visão pré-milenarista, presente tanto no protestantismo histórico como no pentecostalismo primitivo, para adotarem uma postura eminentemente pós-milenarista.  E quanto a cosmologia que vão aprofundar a visão maniqueista do mundo e consequentemente vão compreender como sendo papel exclusivo da igreja e do cristão se alistar e lutar ao lado de Deus (do bem), contra as forças do diabo (do mal).  Como conseqüência disto, observa-se que sendo que tudo de bom provém de Deus e tudo de mal do diabo, então retira-se a responsabilidade pessoal do cristão, enfatizada pelo protestantismo avivalista, para se fazer da vida cristã uma busca de manifestações divinas ou diabólicas para ao lado delas, ou contra elas lutar – interessante também e digno de nota é a postura política dos grupos pós-pentecostais: bem mais agressiva que qualquer outro grupo não-católico.
Ainda quanto à classificação teológica do protestantismo brasileiro, convém ressaltar dois pontos: hoje em dia o fluxo de pessoas que trocam de comunidade, ou que, mesmo mantendo-se filiadas a um determinado grupo, freqüentam reuniões de outros grupos, é bastante significativo fazendo com que as distinções doutrinárias já não mais respeitem os limites institucionais, ou seja, nota-se a presença de aspectos teológicos tipicamente tradicionais em grupos tidos como pentecostais e vice-versa.  O outro ponto é que também podem ser observadas outras posturas teológicas como: fundamentalistas ortodoxos; calvinistas; progressistas; entre outros, porém em menor número e com menor peso político-teológico na vida e estruturas da igrejas protestantes no Brasil.


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