A primeira vez que eu ouvi uma
ópera inteira foi lá pelo anos 1980.
Para dizer o dia certo, já não consigo – faz tempo! Naquela época eu acabara de me mudar para o
Recife e alguns bons amigos eram músicos. A maioria ainda estudante, também de
música, e algumas vezes eu era o único não-músico do grupo, mas a convivência
era boa e sempre fui bem aceito ali.
O que me lembro é que era um
sábado à tarde e fomos para a casa de uma colega assistir em VHS (imagina o
tempo!). Ela tinha locado – sim, na
época se fazia isso! – uma fita e seria o programa da tarde e noite do sábado. E tinha pipoca também.
Eu lembro ainda de particularmente
estar empolgado com a ideia, pois seria meu debut
e a companhia de gente da área ajudaria.
Mas tinha um outro lado: era como um rito de passagem e eu, pouco mais
que um adolescente, precisava daquilo para ser "parte" do grupo.
Fui, vi e, principalmente, ouvi.
Hoje, olhando para trás, reconheço
que a gravação não era primorosa, nada de imagem ou som digital – não se tinha
isso na época. Além de que, como logo
cheguei a perceber, era uma ópera cantada em italiano em um vídeo legendado em
francês.
— Agora, imagine entender alguma coisa!?
A ópera era Nabuco, do italiano
Guiseppe Verdi e, até por ter sido a primeira vez, aquela experiência nunca
mais saiu da minha cabeça.
É claro que depois daquele dia já
ouvi outras peças clássicas. No teatro
inclusive várias vezes. O tempo e as
circunstâncias me proporcionaram manter aquelas amizades e desenvolver outras
com bons músicos: pessoal de orquestra e coro – o que ajudou a continuar ouvindo
música boa.
Mas a primeira, sempre será a
primeira.
Agora, escrevendo estas linhas,
fiz questão de não consultar especialistas, nem buscar na internet informações
mais detalhadas sobre a obra, nem ao menos ouvi-la mais uma vez. O que eu quero aqui é deixar que as
lembranças daquela tarde de sábado apareçam no texto.
Bem, estou ciente que a esta
altura talvez as lembranças daquela tarde já tenham se misturado com outras que
fui recolhendo ao longo do caminho e seja difícil distingui-las agora. Mas tudo bem!
Vamos lá:
Enquanto os músicos-ouvintes se
dividiam entre ouvir e comentar o que se via na telinha da TV, eu apenas me
deixei levar por aquele som novo. Meio
na dúvida, confesso hoje (mas naquele dia jamais confessaria).
Então, a verdade é que fui tomado
– ou absorvido – pela dramaticidade, teatralidade e intensidade da ópera. A
música é poderosa! como diria o personagem Edward Lewis no filme Pretty Woman (já escrevi sobre este
estado de arte: leia aqui).
Lembro de terem falado enquanto
ouvíamos sobre libreto, árias, recitativos, mezzo-soprano, contratenor, largo,
alegretto e por aí. Termos que depois me
tornariam familiar, mas que à época apontavam a qualquer região nebulosa da
minha mente e pouco, ou quase nada, significavam para mim.
E música prosseguiu.
Ainda lembro vagamente que a
história se passava entre os hebreus exilados na Assíria e que entre o enredo
havia uma situação romântica entre um oficial assírio e uma garota hebréia – ou
seria o contrário, sei lá. Também já não
tenho certeza se esta lembrança remonta àquela tarde ou já a acrescentei
depois. Não importa.
Lá pelas tantas, o coro dos
exilados hebreus cantou a dor de viver em terras estranhas. Aquilo entrou pelos meus ouvidos, acionou
qualquer interruptor lá dentro e ecoou. Claro
que não me lembro das palavras da música, mas, ainda assim, nunca mais esqueci
de ter me sentido tocado pela situação. E
ainda hoje, quando escuto aqueles acordes, mesmo que poucos deles, a alma vibra
em consonância.
Dizer sobre aquela experiência que
ela ajudou a formar o que sou hoje, como escuto música, como vivencio a arte, e
até como faço teologia é a mais pura verdade.
Foi e é – tem de ser – tocante.
Agora que já compartilhei um pouco
da lembrança da primeira ópera, vou procurar ouvir novamente a mesma ópera
italiana. Hoje tenho certeza que posso
achar para ouvir e ver em melhor qualidade.
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