Um belo Salmo de Asafe descreve o Senhor Deus soberano presidindo a sua assembleia solene:
"O Senhor, o
Deus Poderoso, convocou a humanidade.
Ele convoca os céus e a terra"
(Sl 50).
Atributos grandiosos e singulares de Deus estão cantados de maneira exuberante em todo o Salmo; na segunda parte (versos 7 a 15), porém, quando o salmista dá voz poética ao próprio Deus, é que podemos perceber quem é o Senhor e como somos distintos dele.
Descrever Deus é sempre logicamente complicado, bem como nossa relação com ele. Deus é amor (1Jo 4:8) e fogo consumidor (Hb 12:29). E diante do Senhor não se pode achegar de mãos vazias (Ex 34:20), mas somos convidados a dele receber sem dinheiro e sem preço (Is 55:1-3).
Mas essa ambiguidade é apenas aparente, e Asafe aponta com maestria inspirada quem é o Soberano que rege a solene reunião e como o cultuamos.
Antes de prosseguir, deixe-me lembrar de que no ambiente do salmista a essência do culto consistia no sacrifício de animais em oferta ao Senhor. E os outros elementos, como a música e os recitativos, apenas ornavam o momento do holocausto.
Vamos então atender à convocação para comparecer diante da assembleia e ouvir a demanda divina, conforme salmodiado.
Tudo começa com a apresentação das credenciais daquele que está demandando a adoração: "Eu sou Deus. O seu Deus!" (verso 7). Deus é o que é (leia Ex 3:14 e Is 44:6).
Ele requer adoração pelo que ele é em sua absoluta e íntima essência. Não há necessidade de outros motivos alheios ao seu próprio ser e existência para que me prostre em oferta e culto.
Segue-se a reprimenda. Aqueles cultuantes entenderam tudo errado. Todo o ritual do culto e do holocausto não era uma finalidade em si mesmo. A adoração não consistia em prover Deus ou alimentá-lo com seus víveres.
O Senhor nem só não tem carências para que precise ser suprido como também ele mesmo é o possuidor de tudo que existe (versos 9-13). Ele é o criador e dono de tudo e estabeleceu um povo para seu louvor exclusivo (vá ao Sl 24:1 e a Is 43:21).
Quando nos achegamos ao nosso Deus em adoração não o fazemos por que ele seja um coitadinho e precise nas minhas ofertas. Meus esforços ou minhas ofertas nada acrescentam a um Deus que já é completo em si mesmo.
E nesse ponto parece escorrer uma pitada de ironia bem humorada - alegria e bom humor também são características divinas essenciais.
— Eu conheço cada passarinho silvestre!
— Todos os bichos da fazenda e do campo estão no meu inventário!
— Fala sério, se eu tivesse fome, você acha que eu lhe diria?
— Realmente, eu não preciso dos seus bois!
Então, por que e como devo ofertar o holocausto? Em que deve consistir minha adoração? Qual a razão da minha liturgia e do meu culto?
E a resposta está cantada ao longo do Salmo:
"Tragam a
Deus oferendas de gratidão.
Aclamem a sua glória. Pois é isso que o honra.
E sua salvação será revelada a vocês"
(Sl 50)