Já faz mais de dez anos que Deus
tem me dado a oportunidade de atender líderes cristãos de diferentes
denominações com níveis diversos de adoecimento emocional.
Nestes anos, pude ver atitudes,
comportamentos e escolhas que ao meu ver são grandes gatilhos para um
ministério frustrante, adoecido e com sequelas para líderes e seus familiares.
Neste ínterim, talvez de maneira pretensiosa,
resolvi fazer uma lista de alguns conselhos, principalmente para os jovens
(ainda não tão moldados), que hoje almejam o ministério como um chamado para
suas vidas.
Já adianto que a lista é também
para mim.
1) Mostrem suas fraquezas. Com o tempo, aprendi a admirar os líderes
inseguros, frustrados, sinceros, depressivos e cheios de dúvida. Os mais perversos que atendi eram os com
respostas prontas para tudo, com convicções inabaláveis, sempre “cheios de
Deus” e com um ar de espiritualidade vazia que inibia um contato mais íntimo. Usavam de uma espiritualidade afetada para
esconder sérias doenças emocionais. Tenham
medo dos “muito crentes”, dos sempre “cheios de fé” e dos que frequentemente
tem uma “revelação espiritual” na ponta da língua.
2) Avaliem quem está ao se redor. Não se iludam, líderes cristãos vivem
rodeados de pessoas para eventos sociais e eclesiásticos mas tem poucos amigos
e confidentes. Me assusta que as vezes é
diante de um Psiquiatra que os líderes falam pela primeira vez de seus
problemas e vicissitudes. Estar rodeado
de gente não é sinal de estar aprovado por Deus; lembrem-se que celebridades de
diversas áreas tem seguidores (físicos e virtuais) mesmo que vivam uma vida
fútil e cheia de frivolidades. Tenham
amigos com os quais você possa compartilhar suas dúvidas, angústias, imperfeições,
tentações e compulsões mais íntimas, sem medo de ser julgado.
3) Não use o diabo como álibi. Ele existe e é atuante, mas, normalmente
somos tentados por nossas próprias concupiscências. Você sempre será tentado a atribuir ao diabo
responsabilidades e erros que são seus. É
tentador buscar soluções mágicas em inúmeras sessões de “batalha espiritual” e
libertação, sem olhar para dentro de si e aceitar que há processos na alma que
precisam ser tratados. Nossos maiores
“demônios” são nossas fantasias e fortalezas da mente, que necessitam de um
longo prazo de luta e dedicação para serem “exorcizados”.
4) Cuidado com os números. Números são frios e trazem ansiedade. Não meça seu ministério pelo crescimento
numérico e tampouco se angustie se ele não ocorrer. Da mesma forma, não abra mão de suas
convicções teológicas ou busque soluções de marketing eclesiástico para
promover um crescimento artificial que só lhe trará sofrimento físico e
emocional. Vi muitos que em busca de um
crescimento numérico a qualquer custo, longe de uma verdadeira intimidade com
Deus, se tornaram frios, depressivos ou ditadores de comunidades regidas pelo
medo. Não se deprima com números
aparentemente fracos, creia que se estiver fazendo o que Deus mandou ele dará
uma comunidade saudável compatível com sua estrutura emocional e espiritual. Há muita angústia envolvida em querer crescer
um ministério a qualquer custo.
5) Se dedique a família. Atendi vários líderes em que presenciei uma
incongruência entre suas vidas nos púlpitos e dentro do lar. O ministério saudável não pode produzir
filhos e esposas machucadas e revoltados com Deus ou Igreja. Conheço vários filhos de pastores e líderes
que tem ataques de pânico se simplesmente passarem na porta de uma igreja. São vítimas de pais “cristãos” que, com a
desculpa de que estavam servindo a Deus, trocaram minutos preciosos de
conversa, amizade, brincadeira e diversão com os filhos por reuniões
ministeriais que normalmente não levam a nada.
Há esposas que chorando me dizem querer serem casadas com o esposo que
está no púlpito e não com o que está dia a dia dentro de casa. Uma família equilibrada será sempre um bom
termômetro de uma vida abençoada por Deus.
6) Examine-se frequentemente. Tenha em mente que uma vida emocionalmente doente
não irá gerar uma espiritualidade saudável e vice-versa. Pastores doentes irão produzir uma comunidade
igualmente doente, fragilizada e contaminada por emoções que distorcem sermões
e atitudes práticas no dia a dia pastoral.
Saiba que há sempre uma transferência emocional explosiva entre o
púlpito e os bancos da Igreja, para o bem ou para o mal. Sermões duros, cheios de cobrança e
desprovidos da graça podem esconder emoções desequilibradas por parte de quem
os pregam.
7) Humanize-se! Tenha momentos de lazer em família, mas também
individual. Pratique esportes e
lembre-se que biblicamente somos corpo, alma e espírito. Não perca a oportunidades de cultivar hobbies e passeios que te desconecte em
alguns momentos da realidade pesada do dia a dia e desperte em você uma certa
puerilidade que lhe cure e humanize.
8) Cuidado com os extremos
teológicos. O tradicionalismo em
excesso, a erudição e o conhecimento bíblico seco e obsessivo podem lhe tornar
um cristão chato, insuportável, insensível, vaidoso, pesado e distante de
pessoas comuns que podem ser verdadeiramente abençoadas com o “conhecimento de
Deus”. Seja reformado, mas, seja também
pentecostal. Não se iluda. A frieza tradicional desumaniza tanto quanto
o misticismo pentecostal. Por outro lado,
se pentecostal, não paute suas decisões emocionais em profecias, campanhas ou
amuletos cristãos que no fundo só aumentam sua ansiedade e imaturidade.
Autor: Ismael Sobrinho, psiquiatra e estudante de teologia.