quarta-feira, 11 de setembro de 2024

JESUS E O RACISMO



Certamente Jesus conhecia todo o ranço de preconceito racial que permeava a sociedade judaica – Jesus nasceu e cresceu como um homem judeu, numa comunidade social e religiosa judaica, entre homens e mulheres que reproduziam culturalmente esse posicionamento.  Mas não sucumbiu a esse pecado social (observe a assertiva em Jo 8:46).

Jesus, em sua missão na encarnação, veio buscar e salvar o que se havia perdido – e isso incluía os perdidos nos pecados sociais como o preconceito (atente para o ele disse na casa de Zaqueu – um proscrito social – em Lc 19:10).

Pela postura de Jesus, todos os seres humanos são alvo de igual amor divino e qualquer atitude que considere o outro como menor, desqualificado, indigno ou desmerecedor ofende ao Criador.  E tal postura do Mestre está em plena sintonia com as palavras do sábio antigo que diz ser pecado desprezar o próximo (palavras de Pv 14:21). 

E eu diria: todo preconceito, seja racial, social, econômico, nacional, sexual, cultural, linguístico, ou seja, lá qual for, é pecado pois insulta o Criador.

Então, mesmo vivendo numa sociedade que respirava preconceito em suas entranhas, Jesus fez questão de romper com esses paradigmas e estigmas e demonstrar que seu amor estaria aberto a todos os homens e mulheres, independente da sua posição e situação, independente de sua origem e raça ou gênero.

E para embasar mais essa atitude contrária ao preconceito, como postura ofensiva ao Deus Eterno que ama a todos os seres humanos indistintamente e que deve ser padrão do cristão, vamos trazer outros textos bíblicos para a reflexão.

Ao chamar Abrão e lhe prometer em aliança que dele sairia uma grande nação e que seu nome seria famoso em toda a terra (em Gn 12:1-3 – obs. Deus já cumpriu tudo que prometeu ali!), o Senhor deixou claro qual seria o objetivo desse chamado:

 

— Através de você [e de sua descendência] serão abençoadas todas as famílias da terra.  Destaco: todas.

 

No projeto de Deus para a humanidade, Abraão – e os judeus seus descendentes – não seria o destino final da bênção, nem o alvo principal, nem preferencial da escolha divina.  Pelo contrário: o papel de Abraão nos planos divinos era ser um canal para abençoar toda a humanidade; e isso deveria ser vivenciado com humildade e reverência.  Logo, qualquer atitude de arrogância, soberba e superioridade dos herdeiros dessa promessa e incumbência destoaria por completo do que o Deus da aliança tinha proposto. 

Ou seja, manter uma atitude de preconceito e racismo é exatamente o oposto daquilo que o Senhor tinha como esperado para aqueles com os quais fez a aliança.

Jesus sabia exatamente que ele era o ápice das promessas divinas para a humanidade.  O pecado original atingiu todas as raças da terra e a remissão que ele trazia deveria também ser extensiva a todas as raças.  Nenhuma seria superior, nenhuma teria primazia, nenhuma poderia se posicionar como especial.  Por isso mesmo, ele não poderia aceitar nenhum tipo de preconceito ou racismo – mesmo que disfarçado de justificativa espiritual, moral ou de santidade.

 

 

Sobre o tema do Racismo, leia também:

 

> JUDEUS E SAMARITANOS – uma história de racismo link

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> POR QUE A GALILEIAlink

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terça-feira, 3 de setembro de 2024

JUDEUS E SAMARITANOS – uma história de racismo


Quando da divisão do Reino de Israel, após a morte de Salomão (século IX a.C.), as dez tribos do norte ficaram sob a liderança de Jeroboão, filho de Nebate, com capital em Samaria – em oposição às duas tribos do sul que restaram sob a controle de Roboão, filho de Salomão (a separação está narrada em 1Rs 12). 

Duzentos anos depois, os exércitos da Assíria invadiram Israel e conquistaram Samaria, sob o comando do rei Sargão II, que registrou em seus anais:

 

Cerquei e ocupei a cidade da Samaria, e levei comigo 27 280 dos seus habitantes como cativos.  Tomei-lhes 50 carros, mas deixei-lhes o resto das suas coisas.

 

O registro bíblico afirma que isso aconteceu porque os israelitas adoraram outros deuses, apesar das advertências claras do Senhor contra isso (leia em 2Rs 17:7-12).

Com a deportação dos israelitas de Samaria, e seguindo a política de colonização assíria, a terra foi maciçamente ocupada por outros povos que trouxeram seus costumes, línguas e, principalmente, seus cultos e religião para o norte da região de Israel.

Pouco mais adiante na história, com a queda também do reino do sul – levados para Babilônia no final do século VII – toda a terra ficou sob domínio estrangeiro.

Mas o período de exílio e deportação chegou ao fim com o decreto de Ciro da Pérsia que permitiu a reconstrução de Israel, de Jerusalém e do seu templo (confira 2Cr 36:22-23 e Ed 1:1-2).

Aconteceu que o projeto de reconstrução liderado por homens como Esdras, Neemias, Zorobabel e Ageu – com o expurgo dos estrangeiros, principalmente das mulheres – não teve a adesão dos habitantes do norte, ficando eles isolados em guetos sociais. 

A situação só veio a piorar com o domínio helênico dos selêucidas, ao estabelecer a separação entre judeus (no sul) e samaritanos (ao norte) em províncias distintas.  Chegando à época de Jesus com uma total inimizade entre habitantes das duas províncias.

E ainda sobre o mapa da Palestina no tempo do Novo Testamento, uma observação importante: mais ao norte da província de Samaria, moravam os galileus – um enclave de judeus que ficaram separados dos do sul pela presença dos samaritanos.  Esses eram considerados como um povo pobre e de pouca cultura (em geral o termo galileu era usado como um insulto, ou como marca de desprezo e preconceito).

 

Ainda havia a questão religiosa.  Os judeus sulistas (assim como os galileus) em geral estigmatizavam os samaritanos por os considerar impuros quanto aos rituais da Lei, logo, indignos de frequentaram os ambientes sagrados das sinagogas e do templo central em Jerusalém e, portanto, separados da aliança com o Eterno. 

Os samaritanos do norte, por sua vez, adotavam como livros sagrados apenas os cinco livros de Moisés (o Pentateuco), rejeitando os Profetas e os Escritos Restantes que eram lidos como sagrados entre os judeus.  Eles acusavam os judeus de terem acrescido à Revelação textos não autorizados, e assim defraudado a Palavra do Senhor.

 

Em todo caso, e apesar de viverem política e militarmente subjugados aos romanos, os judeus na época do Novo Testamento se viam como um povo especialmente superior a todos os outros. 

A própria crença generalizada da esperança messiânica entre os judeus do primeiro século demonstrava que aquela situação política desfavorável não fez arrefecer o sentimento de superioridade.  Por essa crença, Deus haveria de enviar um Messias para unificar as diversas facções de judeus (inclusive os impuros samaritanos) e liderar um exército contra os invasores latinos e os levaria à vitória, fazendo com que o povo voltasse a ser a grande nação da terra.

Os judeus se apegavam a herança e descendência de Abraão e a aliança feita com Moisés no Sinai para se jugarem raça escolhida e um povo essencialmente superior a qualquer outro.  Daí alimentar um posicionamento de preconceito racial com qualquer outro povo ou grupo.

E, finalmente, para se ter uma ideia de como esse sentimento era forte entre os judeus, veja duas citações: (1) debatendo com Jesus, os líderes religiosos argumentaram sua posição de superioridade afirmando que, por serem descendentes de Abraão, nunca teriam sido escravos – ou estiveram em posição se inferioridade (leia o diálogo em Jo 8 começando no verso 31 e a frase dos judeus no verso 33).

(2) Também, mesmo já em plena expansão missionária da igreja primitiva, o apóstolo Pedro – judeu de nascimento e tradições – precisou de uma visão especial e sobrenatural para que se livrasse da visão preconceituosa que tinha contra os não-judeus e se dispusesse a pregar na casa do romano Cornélio e aceitasse que o Espírito também estaria sendo derramado a todos os povos da terra (veja toda a narrativa em At 10).

 

 

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