sexta-feira, 3 de abril de 2020

MARIA DE MAGDALA


Resolvi pensar um pouco sobre Maria Madalena.  Juntou os tempos de quarentena com os dias da Quaresma e a figura da Madalena me veio à mente.
— Qual a relação?
A despeito do que tradição, interpretações dúbias, citações apócrifas e sucessos pops tenham dito, Maria Madalena é uma figura bíblica.
Então, certo de que só vou me ocupar do que eu encontrar nas páginas sagradas, volto a questão: Qual a relação entre a Quaresma e a Madalena?
Resposta rápida: Maria Madalena aparece nos Evangelhos somente nos relatos da paixão – morte e ressurreição de Jesus (veja Mt 27 e 28 / Mc 15 e 16 / Lc 24 / Jo 19 e 20 – há uma exceção em Lc 8:1-2 quando o evangelista cita a Madalena entre as mulheres que davam suporte ao ministério de Jesus).
Vamos além.
A Bíblia não apresenta muitos detalhes sobre seus personagens – principalmente as mulheres.  Sabemos que ela era de Magdala, uma aldeia distante uns 10 km de Cafarnaum, a base do ministério de Jesus e que dela foram exorcizados sete demônios.
Idade? Aparência? Personalidade? Liderança? Manias? Jeitos? ... Nada! Nada! Nada!
Deixe-me logo aproveitar para apresentar a figura que tenho em mente quando leio sobre essa Maria de Magdala.
Eu penso nela como uma matrona, uma mulher de idade madura, respeitável pela experiência de vida e pelo procedimento.  Uma espécie de mãezona que passou a viajar junto com a caravana do Rabi Jesus ao longo do seu ministério.
Não sou o único a pensar nela assim, nem tenho documentos que sustentem essa visão, mas acho bem plausível e coerente.
Assim, chegamos ao pé da cruz no Monte Calvário.  O discípulo amado estava ali – o único dos discípulos homem – mas também a mãe do crucificado, sua tia, a mulher de Clopas e a Madalena (a lista está em Jo 19:25-26).
Ali estava ela, provavelmente com o rosto banhado de lágrimas.  Ideias confusas tumultuavam sua mente e uma terrível sensação de impotência a dominava.
Depois se ver livre de demônios, de caminhar com o Mestre, de compartilhar sonhos e expectativas: agora o duro madeiro.
Madalena no Gólgota me representa quando sinto o gosto amargo da frustração, o obscuro vazio, o incerto porvir.  E agora?  Não pode acabar assim!
Mas não acabou.
Na madrugada do primeiro dia é ela, a vivida Maria de Magdala que estava no jardim do sepulcro para cumprir seus últimos rituais fúnebres.
Não há tempo nem experiências que nos preparem para isso.
E eis que uma voz interrompe o choro: Mulher, por que choras? (Jo 20:15).
É o ressuscitado.  Aquele que a livrou dos sete demônios, deu-lhe a oportunidade e prazer da companhia na caminhada.  Aquele que a conhecia na intimidade a ponto lhe chamar pelo nome:  Maria! (verso 16).
Assim o novo irrompe sobre o caos e a incerteza da vida que precisa continuar, trazendo-lhe novo alento e significado.
Nesse tempo de Quaresma e quarentena, nesse tempo de recolhimento, reflexão e incerteza, estou com a Madalena, tentando disfarçar lágrimas e enxergar futuro.  Aqui é também que eu consigo ouvir aquele que venceu a morte me chamando pelo meu nome.
Então o jardim não é mais de sepulcro, nem é mais assustador, e nem muito menos solitário: Eu vi o Senhor! Ele vive!
Que nos traga Cristo consolo, esperança e nova intimidade, nesse tempo de solitude, como o fez com aquela senhora de Magdala.

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