Quando me perguntam se sou
tradicional, com sinceridade, tenho dificuldade em responder. Bem assim é, se a questão envolve ser
conservador – também difícil. Já quando
se fala em ser saudosista, fundamentalista ou ortodoxo, confesso que a primeira
resposta que me vem é dizer não! Mas
com ressalvas! E explicações.
Reconheço que, de algum modo,
todas estas palavras compartilham significados comuns, porém os detalhes
semânticos e as conotações históricas que elas têm assumido ultimamente me
fazem preterir um ou outro termo.
Já confessei que "Meu cristianismo não nasceu nesta geração!" e
continuo entendendo da mesma maneira, porque é verdade. Então, para deixar tudo mais claro, vou
tentar expor algo sobre o tema. Venha
comigo.
Vamos começar citando a Bíblia – é
a nossa regra de fé e prática. E o texto
que tomo como base é a ilustração das duas casas e dos dois fundamentos (no
final do Sermão da Montanha em Mt 7). Ali
Jesus diz que ouvir e praticar seus ensinos é o fundamento para a proposta de
vida que ele estava anunciando, e que hoje chamamos apropriadamente de vida
cristã.
E, aprofundando mais, veja o que
Paulo diz sobre o assunto: "Porque ninguém pode pôr outro fundamento, além
do que já está posto, o qual é Jesus Cristo" (1Co 3:11). Mais: na carta de Pedro eu posso ler sobre
Jesus Cristo: "Pelo que também na Escritura se contém: Eis que ponho em
Sião a pedra principal da esquina, eleita e preciosa; e quem nela crer não será
confundido" (1Pe 2:6).
Então que fique definido: Jesus Cristo,
sua vida, ensino, exemplo e palavras, é o fundamento da minha fé. E nele permaneço.
Mas aí é que começa o problema! Ao
longo da história tantos e quantos leram e interpretaram as páginas sagradas de
tantas e quantas formas diferentes que parece até ingenuidade esse tipo de
afirmação.
E para piorar, têm os exemplos
deploráveis da nossa história que nos fazem corar de vergonha. Em nome da fé, marchamos para Jerusalém
deixando um rastro de sangue pelo caminho.
Condenamos mulheres ditas infiéis na fogueira. Matamos camponeses alemães. Desterramos peregrinos na América. Convertemos negros e índios à força. Perpetuamos animosidades nas ilhas britânicas. Justificamos a barbárie nazista. E isso sem falar nos cristãos de hoje que
revestem de sua crença num verdadeiro ódio aos diferentes. Então vou parar a lista por que o gosto
indigesto de sangue já está incomodando.
Mas, quer saber de uma coisa?
Permaneço firme no fundamento. Sei que
às vezes é difícil lidar com essas heranças malditas que enlameiam nossa
construção histórica daquilo que temos chamado de cristandade.
Então me vejo olhando para trás e
me forçando a continuar construindo com humildade e confissão penitente. Aquilo tudo foram paredes levantadas sem que
o alicerce fosse respeitado. Então,
apenas peço perdão e sigo adiante.
É verdade que há um outro lado na
história, e só para lembrar sem deixar o texto muito cansativo, vou passar a
palavra a Ariosvaldo Ramos:
Nós
sempre propugnamos pela liberdade. Nós
impusemos a Carta Magna ao Principe John, na Inglaterra; construímos o Estado
Laico na revolução americana, quando, numa nação majoritariamente cristã, todas
as confissões religiosas foram tidas como de direito. Nós lutamos entre nós pelo fim da escravidão,
seja na guerra da Secessão, seja por meio de Wilberforce, premier Inglês, e de
tantos outros movimentos. Nós
denunciamos e enfrentamos os que entre nós quiseram fazer uso da nossa fé para
legitimar a opressão. Os maiores
movimentos libertários nasceram em solo cristão, e mesmo quando renegavam ao
que críamos, não havia como não reconhecer a nossa contribuição à emancipação
humana.
Nós
construímos uma sociedade de direitos, lutamos por e reconhecemos direitos
civis, e não podemos abrir mão disso; não podemos abrir mão da civilização que
ajudamos a construir e a solidificar, onde mulheres, homens e crianças são
protegidos em sua integridade e garantidos em seus direitos. Na democracia que ajudamos a reinventar, onde
cada ser humano vale um voto, tudo pode e deve ser discutido segundo as regras
da civilidade.
Retomando minha reflexão.
Sendo fiel ao fundamento: há
verdades essenciais que herdamos junto com todos os cristãos – os latinos
diziam: Cristus Dominus. Há verdades que compartilhamos com irmãos
reformados – ainda em latim, sola gratia. Há ainda verdades que, como Batista me são
caras – em bom português, o sacerdócio universal de todos os salvos.
Sei que cada um destes princípios
fundamentais pode ser destrinchado e que eles compõem um quadro maior de
crenças, mas com certeza, continuam estáveis no alicerce de minha vida e fé.
Assim, em resumo, mesmo
envergonhado com manchas na história. Não
importa o que outros disseram ou fizeram: permaneço no fundamento – Jesus,
autor e consumador de minha fé.
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Texto lúcido!Tenho crido que essa superficialização da fé se dá justo pelo não entendimento das coisas simples e pautadas pela palavra.
ResponderExcluirConvicção é ojeto ou meta, ou um entretom com o qual nos pintamos a bem da conveniência?
Abraço pastor, sempre bom ser abençoado pela inspiraçãode teus estudos.
Obrigado querido.
ExcluirCristo é nosso fundamento sólido - e isso é a pura verdade. Se construirmos nossa vida nele e no seu projeto de vida simples e acolhimento do outro, do necessitado, do excluído e não nas esclerosadas interpretações e atitudes de alguns que não honram a herança cristã, nossa fé terá valiado à pena.
Um abraço.
Ótimo texto!
ResponderExcluirObrigado querida. A glória seja a Cristo, o nosso fundamento
ExcluirJESUS,AUTOR E CONSUMADOR DA NOSSA FÉ.EXISTE FUNDAMENTO MAIOR?
ResponderExcluirAmém querido. Só Jesus é nosso fundamento verdadeiro e seguro!
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