Ninguém duvida da importância da música para o
indivíduo e para a sociedade. Ela é tão importante que o poeta nordestino
Geraldo Azevedo chega a afirmar que "quem inventou o amor teve certamente
inclinações musicais" e, Rubem Alves, "que o povo cantou a Reforma
antes mesmo de entendê-la" (Dogmatismo e Tolerância, Edições Paulinas, SP,
1982).
A música é significativa na identificação de um
grupo social. Chega a ser símbolo
nacional. No caso batista, a
encadernação do Cantor Cristão junto com a Bíblia, por razões econômicas e
operacionais, contribuiu de forma tal para o fortalecimento simbólico do
Hinário que, para alguns, a autoridade de suas letras, como as da Bíblia,
deveria ser indiscutível e insubstituível.
Suas letras e melodias, continuam servindo de identidade para boa parte
das reuniões de batistas.
É interessante analisar os resultados dos
investimentos em educação musical, feitos pelas denominações, bem como da
popularização tecnológica dos meios de reprodução de sons e partituras. Se por um lado, eles possibilitaram o
crescimento e a proliferação da produção nacional de música evangélica, por
outro, contribuíram para o enfraquecimento de um dos pilares simbólicos da
nossa identidade denominacional, o Cantor Cristão.
A partir desse fato, houve uma divisão entre os que
defendiam a manutenção exclusiva, nos cultos, dos hinos tradicionais do
referido hinário, e os que defendiam a inclusão de hinos e cânticos
contemporâneos. O HINÁRIO PARA O CULTO
CRISTÃO foi uma tentativa de conciliação, mesclando hinos antigos e novos com o
propósito de, sobretudo, preservar a identidade batista. O maior obstáculo porém, a esse projeto, tem
sido a tecnologia. É que é muito mais
cômodo e menos oneroso cantar lendo uma projeção de um retroprojetor do que ter
que adquirir e segurar um pesado livro. É
muito mais fácil e agradável aprender novos hinos ouvindo-os através de um CD
ou do rádio, no conforto do lar, do que repetindo-o, sob a orientação de um
regente.
Sem perceber ou querer admitir essas realidades e
na tentativa de fazer prevalecer um tipo de música em detrimento de outro, a
postura de alguns tem sido a de combater a escolha musical alheia. Subliminarmente a "argumentos
técnicos", subsiste uma velada disputa política, no sentido de fazer
prevalecer gostos, costumes, crenças e valores. Em nome da boa "qualidade técnica",
percebe-se a defesa de músicas oriundas de países colonizadores e a acusação
das geradas na própria região ou em países subdesenvolvidos, como sendo de mau gosto
e, até, demoníacas; as executadas nos encontros da elite social são as de bom
gosto e as cantadas pelas massas, ruins. Por isso, tão importante quanto avaliar a
música evangélica contemporânea em seus aspectos estéticos ou teológicos,
seria, também, pôr em xeque os
pressupostos sociológicos embutidos na postura de seus críticos.
Para a maioria das pessoas, a qualidade (conceito
bastante relativo) de uma música está menos ligada a sua origem
geográfico-econômico-cultural e mais às lembranças e sentimentos que suscita. Precisamos, por isso, superar o complexo de
colonos, cujo ideal de vida é a vida dos colonizadores e, sem xenofobismo,
investir numa educação musical democrática que garanta ao povo o direito que
lhes é inerente, de fazer uso, também, do que tem sido produzido em seu
círculo, a fim de que, a partir dessa experiência, se continue a construir uma
qualidade musical cada vez melhor.
Este texto
foi escrito pelo meu amigo e colega o Pastor Edvar Gimenes de Oliveira há mais
de uma década, quando ainda pastoreava na cidade do Recife. Como eu acredito que os argumentos continuam relevantes, e bons para começo de conversa, aí está publicado.
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