sexta-feira, 22 de novembro de 2013

SÚPLICA CEARENSE

Todo nordestino que se preze sabe que ninguém representou melhor a nossa gente e a nossa cultura como o pernambucano Luiz Gonzaga (1912 – 1989).  Com a sua música – a nossa música – seus trajes, causos e tradições o filho de Januário expressou o jeito e a alma deste povo de cá para os de lá como jamais alguém havia feito.
Desde a seu primeiro instrumental: Vira e mexe – um chamego gravado em 1941 ainda em 78 RPM; passando por sua mais famosa música: Asa Branca – feita em parceira com Humberto Teixeira; até as últimas gravações já em 1989, ele tocou e cantou o Nordeste brasileiro.  Foi inigualável.  Sem dúvida, o Rei do Baião.
Em forró, xote, baião, xaxado e tal, ele falou das alegrias, tristezas, esperanças, paixões, fraquezas e forças das terras nordestinas.  Se você quiser exemplos, eles não faltam.  Sugiro ouvir Xote das Meninas, Pense n'eu, Forró de Cabo a Rabo, Respeita Januário, A Triste Partida e por aí vai.  É tanta música boa que fica até difícil falar delas!
Mas o que me chama a atenção de verdade foi a sua capacidade expressar a fé desse nosso povo, pois é disso que eu entendo.  E por vezes é no Véio Lua que eu encontro a sinceridade singela da crença sertaneja.  É uma fé e religiosidade nem sempre clara e desenvolvida, de teologia troncha, com desvios bíblicos acentuados, mas, na maioria das vezes, piedosa e reverente.
Assim é que destaco a Súplica Cearense (gravada originalmente em 1979, mas já hoje com várias versões).  Gosto dela até por Luiz Gonzaga ser apenas o seu intérprete (é de autoria de Gordurinha e Nelinho).  Afinal foi isso que ele sempre foi: nosso intérprete!
O Nordeste estava vivendo uma incomum inundação.  As chuvas concentradas transformaram o semi-árido.  Depois de tanto sofrer com a falta de água, agora era o seu excesso que atormentava.  Então a prece mudou.  Oração verdadeira tem que ter cheiro de terra para tocar o céu.

Oh! Deus, perdoe este pobre coitado
Que de joelhos rezou um bocado
Pedindo pra chuva cair sem parar

Oh! Deus, será que o Senhor se zangou
E só por isso o sol se arretirou
Fazendo cair toda chuva que há

E a súplica continuou confessando a mágoa no coração nordestino pelo sol cruel e a necessidade de aprender a orar.  Confissão e súplica sempre andam juntas.

Meu Deus, se eu não rezei direito o Senhor me perdoe,
Eu acho que a culpa foi
Desse pobre que nem sabe fazer oração

Meu Deus, perdoe eu encher os meus olhos de água
E ter-lhe pedido cheinho de mágoa
Pro sol inclemente se arretirar

É quase um choro.  Os olhos mareados.  A alma ressecada.  Sinceridade, humildade e piedade mesmo que de doutrina rala.  E eu acho que tocou o coração de Deus, como sempre ainda toca o meu.

6 comentários:

  1. Muito bom, me fez repensar assuntos esquecidos.

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    1. Que bom querido!
      Algumas vezes estão neste assuntos assuntos algumas das preciosidades que o Mestre reserva para nós.
      Um abraço

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  2. Lindo texto! Refleti outro dia sobre essa canção. Concordo, é desse jeito!!!

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    1. Que bom que você gostou!
      Quando quiser refletir sobre canções como esta, compartilhe conosco.
      Um abraço

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  3. Excelente reflexão! A aproximação crítica entre Evangelho e cultura é interessante e o forró do nordeste é um ótimo ambiente para o diálogo! Abraços, pastor!

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    1. Obrigado querido. Minha súplica é que Deus continue usando nossa cultura nordestina para seu louvor e glória.
      Abr.

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