terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

A oração de um profeta menor

Ó Senhor, tu me chamaste para uma grande missão! Ó Senhor, meu Senhor, tu te aviltaste honrando-me como teu servo.  Tu me ordenaste teu mensageiro, Deus meu, não perderei tempo deplorando minha fraqueza nem minha incapacidade para a obra.  Quem sou eu para argumentar contigo ou duvidar de sua soberana escolha? A tua vontade seja feita e não a minha. 

Ó Deus, os falsos pastores andam por toda parte, negando o perigo e rindo dos riscos que o teu rebanho corre.  As ovelhas estão sendo enganadas por esses mercenários e os seguem com lealdade tocante enquanto o lobo se aproxima para matar e destruir.  Suplico-te, ó Deus, dá-me olhos penetrantes para perceber a presença do inimigo; dá-me entendimento para observar e coragem para contar fielmente o que vejo.  Torna minha voz tão idêntica à tua que até mesmo as ovelhas doentes a reconheçam e te sigam. 

Senhor Jesus, aproximo-me de ti para receber preparo espiritual.  Impõe sobre mim a tua mão.  Unge-me com o óleo do profeta do Novo Testamento.  Salva-me da maldição da imitação e do profissionalismo que paira sobre o pastorado moderno.  Cura minha alma das ambições carnais e salva-me da atração da publicidade.  Livra-me da escravidão às coisas.  Não permita que desperdice meus dias com trivialidades.  Ensina-me a autodisciplina para que possa ser um bom soldado de Cristo. 

Embora escolhido por ti e honrado por um chamamento sublime e santo, não permita que eu jamais esqueça que não passo de pó e cinzas, um homem que com todas as falhas e paixões naturais que perseguem a raça humana. 

E agora, Senhor do céu e da terra, consagro o restante de meus dias a ti; sejam eles muitos ou poucos, conforme a tua vontade.  Sou teu servo e essa vontade é para mim mais doce que posição, riqueza ou fama.  Amém.  AMÉM. 

A.W.  Tozer

 

terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

SOBRE O PLURAL DE MAJESTADE

 


Vamos olhar o texto e pensar teologicamente um pouco:

 

Sobre o plural de majestade, esse conceito latino do uso do verbo no plural é bem aceito por alguns exegetas.  Mas também é preciso tomar cuidado aqui pois o verbo אמר (dizer – disse) usado no verso de Gn 1:26 e em todo o capítulo, mesmo se referindo ao Deus majestoso, está no singular.  Da mesma forma o verbo ברא (criar – criou) no verso Gn 1:1.

É interessante também observar que esse fraseado plural só é encontrado aqui no texto Hebraico do AT.

 

Em relação ao conceito de Trindade aplicado à expressão do verso 26.  Embora eu creia na doutrina cristã que expressa um Deus manifestado em Três Pessoas (e há bons textos bíblicos que apontem nessa direção), mas vê-lo aqui é um pouco forçado.

 

Talvez a resposta mais simples seja a melhor (como sempre em Teologia!): na forma poética do texto bíblico, o autor evita um imperativo singular – a Deus não se dá ordem, nem como recurso literário – então preferiu uma flexão plural em primeira pessoa para indicar a disposição divina em moldar o ser humano. 

O Criador nos fez de modo singular e proposital para o louvor de sua glória (posso alinhar minha compreensão aqui a Ef 1:12 e Is 44:7).  Uma tradução moderna que talvez consiga expressar melhor esse conceito plural/singular seja em língua inglesa: “Let us make ...”

 

 

Para enriquecer sua compreensão do tema, permita-me duas outras sugestões de leitura:

 

DEUS É UMA UNIDADE COMPOSTA?
Num post aqui no Escrevinhando, com base em Dt 6:4, faço uma análise teológica/exegética da divindade cristã que se apresenta ao mesmo tempo como três e como um – acesse o link

 

No meu livro ENSAIOS TEOLÓGICOS há um artigo sobre O Nome de Deus e o Culto do Antigo Testamento que tangencia esse tema.  Pode ajudar na compreensão – ele está disponível no Amazonlink

 

terça-feira, 11 de fevereiro de 2025

ENDIREITAI O CAMINHO

Em toda palavra profética, junto à denúncia do pecado perante Deus, vem também uma palavra que aponta para conforto e esperança. O objetivo divino em ordenar sua palavra aos profetas, nunca é apenas se vingar ou castigar o povo derramando sua ira, mas é os chamar ao arrependimento, trazendo-os de volta à comunhão.

Assim também foi com a profecia de Jeremias. Ele denunciou o quadro triste em que o povo vivia, mas, mesmo aqui, uma palavra de chamada ao retorno ficaria evidente:

“Assim diz o SENHOR dos Exércitos, o Deus de Israel: Endireitai os vossos caminhos e as vossas ações, e vos farei habitar neste lugar” (7.3). Esse sempre foi o objetivo do Senhor ao enviar seus profetas: fazer com que o povo tivesse oportunidade de corrigir suas rotas e se voltarem para ele.

Certamente o castigo pelo pecado é a sua consequência inevitável. Sempre haverá, contudo, uma promessa que acompanha à sentença: “pois assim diz o SENHOR: Toda esta terra ficará destruída; mas não a consumirei totalmente (4.27).

Mas nessa relação de anúncio profético, castigo e esperança, algumas condições deveriam ser observadas.

Começando pela sinceridade do coração. Se a palavra do profeta é sempre um chamado ao arrependimento e à volta ao Senhor, esse movimento não pode ser feito com falsidade. Por isso o chamado é sempre para que haja um coração verdadeiro e sem fingimento diante de Senhor (3.9,10) e nem falsidade nas palavras (5.2). Ou seja, que a verdadeira aliança aconteça nos corações e não apenas como ritual exterior (4.4).

Então, como isso deverá acontecer? Eis a relação de atitudes que são requeridas pelo Senhor: “Mas se de fato endireitardes os vossos caminhos e as vossas ações; se realmente praticardes a justiça entre um homem e o seu próximo; se não oprimirdes o estrangeiro, o órfão e a viúva, nem derramardes sangue inocente neste lugar, nem seguirdes outros deuses para vosso próprio mal, então eu vos farei habitar neste lugar (7.5-7).

Deus continua tendo interesse em atrair e corrigir seu povo. Nunca foi a vontade do Senhor apenas derramar sua ira como um ato punitivo e vingativo. Ele é amor e isso deve estar sempre presente nas palavras proféticas.

 

(A partir da revista “COMPROMISSO” – Convicção Editora – Ano CXVII – nº 468)

  

No mesmo tema, sugiro ampliar sua leitura no artigo “Por que Deus dá a profecia?” onde eu concluo que “Deus dá a profecia para que o mundo – criação conjunta de Deus e seres humanos – possa não ser abandonado à sorte do tem de ser, mas que possa ser vislumbrado sob a ótica do pode ser.”  Acesse no Escrevinhando no link.

 

terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

TOMÁS DE AQUINO – a imagem e a moeda

 


Um colega, aqui conversando aqui comigo, via zap, fez uma citação do mestre Tomás de Aquino quando o teólogo apresentou uma analogia entre a imagem de Deus e a moeda romana com a imagem de César.

Na conversa, ofereci uma reposta para manter o diálogo, mas depois fiquei com o assunto na cabeça.  Tenho pesquisado sobre o tema, pois pretendo escrever um livro sobre os capítulos iniciais da Bíblia.

Então aqui vai um misto do que eu respondi no zap com algo que pesquisei depois.

 

Antes.  Sobre o pensador.  Tomás de Aquino foi um filósofo/teólogo da Escolástica católica que viveu e escreveu no século XIII na região de Aquino – centro da Itália.  Sua abordagem filosófica foi de linha aristotélica e tratava a própria Teologia como uma ciência.

 

Quanto a citação de Tomás de Aquino, o que achei nas minhas pesquisas, folheando a “Suma Teológica” (a edição que uso aqui tem mais de quatro mil páginas) diz ipsis litteris:

 

 “Tanto no homem como na mulher está a imagem de Deus, quanto a aquilo em que, principalmente, consiste a essência da imagem, a saber, a natureza racional” (Questão 93 – art. 4).

“Diz-se que o homem é a imagem de Deus, não por ser essencialmente imagem, mas por trazer no espírito impressa tal imagem; assim como se diz que a moeda é a imagem de Cesar, por ter a imagem deste. Por onde, não é necessário introduzir a imagem de Deus em qualquer parte do homem” (Questão 93 – art. 6).

 

Aproveitando a pesquisa: encontrei no site do Vaticano:

 

Em Tomás de Aquino, a imago Dei possui uma natureza histórica, enquanto passa por três fases: a imago creationis (naturae), a imago recreationis (gratiae) e a imago similitudinis (gloriae) (S. Th. I q. 93 a. 4). Para o Aquinatense, a imago Dei é o fundamento da participação na vida divina. A imagem de Deus se realiza principalmente em um ato de contemplação no intelecto (S. Th. I q. 93 a.4 e 7).

 

Minhas considerações a partir do argumento do teólogo latino:

 

A analogia de Tomás de Aquino, comparando uma moeda com a imagem de Deus (Imago Dei em latim como usou o teólogo italiano), pode enriquecer bastante a compreensão – embora seja uma exegese tardia.

Porém, não penso que o autor bíblico tivesse com tal analogia em mente quando escreveu as palavras sagradas.  Pelo contexto geral, talvez a melhor analogia seria com as esculturas de divindades dos povos ao redor que exibiam a imagem de seus deuses, enquanto que a imagem do Elohim Criador (יעש אלהים – expresso em Gn 1:7) estaria impressa na sua obra prima: o ser humano.

Lendo mais o texto de Gênesis, observo que em Gn 5:3 novamente o termo hebraico צלם (imagem) é usado junto com דמות (semelhança/modelo) para se referir ao filho gerado por Adão.  Neste caso a analogia da moeda perde mais paridade ainda.  Novamente consigo entender que o autor bíblico tem em mente a reprodução da imagem e semelhança viva (Adão gerou outra vida!) em um outro ser.

 

Em resumo, em minha Teologia, leio o poema sagrado do Gêneses querendo comparar a feitura do ser humano com os contornos divinos dando-lhe atributos que espelhassem o Criador.

 

E antes de finalizar, mais uma citação.  Dessa vez de Esteban Voth e Milton Acosta Benitez no “Comentário Bíblico Latino-Americano”:

 

 “Sugerimos que a imagem de Deus nos fala da capacidade que temos para nos relacionar com Deus.  Deus nos estampou algo que permite a ele estabelecer conosco uma relação íntima, por meio de comunicação verbal, alianças etc.”

 

(Na imagem lá em cima, uma reprodução de uma moeda romana estampada a face do Imperador Tibério – 14-37 A.D.  Fonte:  wikipedia.org)