segunda-feira, 22 de agosto de 2022

O HOMO RELIGIOSUS

 

Deixe-me tentar compreender melhor como o humano se faz homo religiosus diante do mundo.  Ao dominar a autoconsciência, o ser humano se vê diante do cosmo que mais lhe parece o caos.  Desta percepção brotará o primeiro estímulo do que virá a ser a sua essência religiosa. 

(...)

Defrontando-se com a realidade imensa da existência que por si só não faz sentido, nem lhe aponta saídas, o ser humano se sente pequeno, fraco e incapaz de transformar o deserto num jardim, o caos num cosmo, a dúvida e a incerteza na confiança e promessa, o ser humano se faz religioso.  Em outras palavras, a sua inconteste e inevitável descoberta de si mesmo e do mundo que o cerca transforma este ser de animal apenas em um homo religiosus: ser humano significa necessariamente ser religioso.  A vida não pode ser somente isto.  É assim que a admiração se transforma em espírito religioso: o maior-que-eu/além-de-mim eu não tenho nem controlo, mas eu tenho a crença.  A poetiza brasileira Clarice Lispector exclamava: "Obstinada, eu rezo.  Eu não tenho o poder.  Tenho a prece".

Desta forma o ser humano se constitui enquanto ente em busca do outro que possa lhe dar sentido e completude diante de um cosmo que não lhe transmite a sensação de contiguidade. (...) Culto e adoração para o ser humano então é a garantia de respostas a suas indagações últimas e a certeza de que não será tragado pela existência caótica.  Na religiosidade busca-se colocar ordem no caos, apoiando-se nos deuses e crenças para que estes lhes sejam favoráveis. 

(...)

Outra observação teórica que posso fazer aqui é a partir das colocações do filósofo romeno Mircea Eliade.  No seu texto sobre O Sagrado e o Profano Eliade usou a expressão homo religiosus para descrever o ser humano, ou seja, um ser determinado acima de tudo pela sua religião e seu senso de adoração.  Na introdução do texto o próprio Eliade observou: "o sagrado e o profano constituem duas modalidades de ser no mundo, duas situações existenciais assumidas pelo homem ao longo da sua história".  E mais adiante, tratando mais claramente sobre como o ser humano encara a existência: "seja qual for o contexto histórico em que se encontre, o homo religiosus crê sempre que existe uma realidade absoluta, o sagrado".  O sagrado determina o ser humano, dando-lhe contornos dos quais ele não tem como escapar.  Estes contornos moldam o ser tanto na sua autocompreensão como nas suas tomadas de decisão.  Ou seja, esta visão faz do ser humano alguém que na sua existência está condicionado pelo transcendente. 

(Extraído do livro DE ADÃO ATÉ HOJE – um estudo do Culto Cristão)

 

 


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