terça-feira, 25 de setembro de 2018

É POSSÍVEL CONHECER DEUS?


Uma das características mais marcantes do ser humano é sua complexa ambiguidade. Seja qual for o ângulo que se observe, o ser humano é constituído de facetas múltiplas. Entre tais ambiguidades, dois aspectos chamam a atenção: a moral e a existencial.
Do ponto de vista moral, o ser humano traz em si fundamentos essencialmente maus e bons. Hora mais propenso a um lado, hora a outro, hora mesclando simultaneamente ambos. Qual seria a verdadeira e primordial essência humana? Como ela se configuraria?
No aspecto existencial, ao ser humano é tocada a vida física – temporal e histórica – e a imaterial – sublime e eterna. Como ambas de configurariam? Como conciliar o final e o porvir? O dado e projetado?
É no âmbito de tais dilemas que a pergunta essencial sobre Deus se encaixa: quem é Deus? Como concebê-lo ou compreendê-lo? É possível conhecer Deus? Vai-se ao seu encontro religiosamente, ou ele mesmo dá-se a conhecer?
Se Deus é bom, por que há mal no mundo? Se Deus é eterno, como toca a história? Num mundo de leis e racionalidade é possível encontrar dados – ou sequer resquícios – que provem à razão humana a existência divina? Em meio a uma fé revelada, é cabível uma interpretação teológica?
Parece-me óbvio que mesmo em diferentes época e por diferentes métodos a busca do ser humano em desvendar os mistérios da divindade não lograram êxito completo e definitivo e Deus – na linguagem barthiana – continua como o totaliter aliter.
Assim, a verdade essencial sobre quem é Deus perdura como o mistério a ser elucidado. Da mesma forma que a própria essência ambígua do ser humano, que lhe aponta a lampejos de bondade e maldade, de glória e vergonha, de limitação e expansão, física e metafísica.
Nesse sentido, a concepção cristã de Revelação e Encarnação como sendo a iniciativa do próprio Deus em se fazer conhecido e se achegar ao ser humano, limitando-se (esvaziando-se) de maneira a se tornar compreensível a homens e mulheres, mesmo em suas carências morais e racionais.
Mas ainda aqui – na concepção cristã – o conhecimento de Deus haverá de ser mediado pelas instâncias da fé. Ou seja, o Deus que é totalmente outro em sua natureza essencial e moral só pode ser percebido quando a fé entra na equação para “calibrar” a razão e então, em trabalho mútuo, religião e racionalidade desvendam o caminho do conhecimento divino.
Acontece que a própria fé e religião cristã naturalmente tendem a um processo de institucionalização e normatização dogmática dos seus postulados – e diríamos que é histórica e conceitualmente impossível se fugir deste processo. O que gera novas questões: como continuar mediando o conhecimento de um Deus inefável mas revelado em meio a fé sistematizada e normatizada?
E mais uma vez a ambiguidade humana se mostra presente. O Deus cristão tanto se mistura aos corredores institucionais da fé como o transcende – assim como o faz tanto na moralidade humana como no cosmo enquanto realidades onde coabitam a ordem e o caos.
Deus pode ser conhecido na fé estabelecida e cultuada a sólida tradição religiosa – e verdadeiramente precisa dela em certo sentido para lhe dar coerência histórica – como dela vai sempre além podendo ser percebido nas peculiaridades humanas.

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