terça-feira, 15 de setembro de 2015

O contexto eclesiástico das epístolas joaninas – 2ª parte

Continuando a examinar o contexto eclesiástico das epístolas joaninas (reveja a primeira parte aqui).

A HISTÓRIA PRÉ-EPISTOLAR DA COMUNIDADE –
A história da comunidade joanina pode ser dividida em três fases (sugestão de R.E. Brown): 1ª fase – antes do Evangelho; 2ª fase – enquanto o Evangelho foi escrito; e 3ª fase – quando foram escritas as epístolas.  Vindo depois a dissolução da comunidade.
A comunidade surgiu como fruto do trabalho e do carisma do Discípulo Amado, anônimo e descrito no Evangelho como aquele que mais compreendeu a Jesus Cristo e que esteve presente em momentos dos mais importantes do seu ministério – por isso Jesus o amava – e este era o orgulho da comunidade dele derivada.
Tendo adotado uma cristologia bem mais elevada que o restante dos igrejas oriundas dos outros apóstolos, não é de se admirar que cedo encontrou inimizade com os judeus, o que fez logo a comunidade os identificar com o mundo (grego: κόσμος).  Mas como conseqüência natural da inimizade com os judeus, se viu forçada a abrir as suas portas para os gentios.  Assim se vê que no momento em que foi escrito o Evangelho, as relações de João com os estranhos à sua comunidade foram decisivas para a comunidade se entender e delinear suas posições frente aos não-cristãos e aos outros grupos de cristãos.
OS FILHOS DA SENHORA ELEITA –
Passadas estas duas primeiras fases em que a coesão interna e a luta contra os inimigos externos serviram de alicerces para a expansão e solidificação da comunidade joanina, a Igreja atingiu um nível que já começava a fugir do controle da liderança.  Outro fator significativo para a falta de controle e o surgimento de problemas é que a sua estrutura até então tinha-se constituído de uma forma extremamente simples.  Com as reuniões acontecendo nas casas dos membros da comunidade e portanto não permitindo a formação de grandes igrejas-núcleo mas sim uma confederação (ou convenção) das diversas pequenas igrejas-núcleo numa determinada região ou cidade, sem que entre elas houvesse necessariamente uma relação de interdependência ou de compromisso mútuo.
Outra característica da estrutura simples que tinham tais comunidades é a falta de uma hierarquia clerical organizada e funcionando.  Já que as comunidades eram basicamente constituídas de igrejas-núcleo composta de poucas pessoas e entre as igrejas não havia uma relação necessária, o clero não só era desnecessário como realmente inexistia.  Ao que parece, a introdução das estrutura de bispado já comum nas outras igrejas apostólicas nas igrejas joaninas foi um dos fatores que causou a sua dissolução na década seguinte.
O certo é que  os unicos elos entre estas igrejas-núcleo nascentes eram terem um herói comum – o Discípulo Amado – e a leitura e aceitação do Evangelho.  Mas como esta leitura foi feita indistintamente das diversas comunidades, o resultado foi o surgimento de pontos de divergência na interpretação do texto, e foi isso que levou o autor joanino a escrever as epístolas: uma tentativa de manter a comunidade unida à única interpretação que julgava correta do Evangelho.

Continua...

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