No ano de
1967 – ano em que nasci – a compositora judia-israelense Naomi Shemer compôs
"Jerusalém de Ouro" (em hebraico: זהב של ירשלים, Yerushalayim Shel Zahav). Quem a primeiro apresentou ao público foi a
até então desconhecida Shuli Nathan no Festival de Música Israelita em 15 de
maio do mesmo ano. E a canção se tornou
um marco da música judaica no século XX, uma espécie de segundo hino nacional
de Israel.
Falar sobre
esta música é sempre um pouco complicado: meus olhos ainda insistem em se
deixar molhar ao sabor de sua melodia e letra.
Então, para facilitar as coisas, vou começar falando sobre o contexto
onde ela surgiu. Depois volto-me à canção.
O Estado de
Israel, como nação moderna, fora criado em maio de 1948 e no ano de 1967 estava
envolvido na chamada "Guerra dos Seis Dias" contra uma liga de paises
árabes – e que depois, como resultado, daria maior controle de Jerusalém às
forças de Israel (mas isso só viria em agosto...).
Em maio,
quando a canção foi escrita, a batalha ainda estava sendo travada e Jerusalém ainda
estava sob o domínio da Jordânia. Então
Shemer, que já havia servido nas forças militares de Israel e já era poetisa e
compositora reconhecida, escreveu sua declaração de amor à cidade.
Mas,
deixe-me voltar à musica porque as lágrimas já estão secando com estas palavras
introdutórias e eu ainda quero aproveitar a emoção!
Escrita em
tonalidade menor, a melodia é uma canção de ninar – a própria autora confessou
a inspiração – que suavemente nos envolve e acolhe como quem apenas suspira
enquanto o coração é acalantado pela esperança que insiste em se alimentar,
apesar da história e das circunstâncias, mantendo-se em absoluta paz. E nos faz sentir em casa.
Há também um
outro sentimento indisfarçável que a música faz aflorar: paixão. Não a paixão arrebatadora dos adolescentes de
hormônios em polvorosa. Uma paixão
serena, profunda e madura que faz vibrar a linha melódica como se o coração igualmente
vibrasse em uma sinfonia: paixão pela cidade santa, paixão pelo lar, paixão
pela paz.
E ainda
sobre a melodia: na primeira audição, a música foi cantada tendo apenas o
violão da própria cantora como acompanhamento, mas sugiro ouvi-la ao som do
violino: é indescritível! Não somente
pela indicação da letra em si – ela diz: "Por que não ser eu o violino para todas as suas canções?" – mas
também porque penso que nenhum outro instrumento melhor faz soar o que a
melodia imprime. Repito: indescritível!
Há ainda a
letra. Escrita no original em hebraico,
ela já foi versada em diversas outras línguas e gravada sucessivas vezes
(inclusive em português por gente famosa: é fácil achá-la na internet). Só que pretendo ser ousado para primeiro
comentar na língua original, e assim deixo o significado para depois.
Ou melhor,
vamos inverter. Falemos primeiro do significado das palavras cantadas.
A partir de
inspirações tiradas do talmude, de poemas clássicos, da tradição popular e de
textos bíblicos, a canção fala da tristeza da cidade solitária, do cheiro
trazido das montanhas que a cercam e do caminho que leva ao Mar Morto. Mas não é uma tristeza final, fatal. É um clamor de esperança, um toque do shofar que chama ao monte do templo, na
cidade velha. Ela canta:
Porém hoje venho cantar para ti
E te elogiar
Eu sou o menor dos teus filhos jovens
E um dos últimos poetas
E te elogiar
Eu sou o menor dos teus filhos jovens
E um dos últimos poetas
Teu nome queima os lábios
Como o beijo de um Serafim
Se eu te esquecer Jerusalém
Que é toda de ouro.
Como o beijo de um Serafim
Se eu te esquecer Jerusalém
Que é toda de ouro.
Sim, o
hebraico. Para ser honesto, nenhuma
versão faz jus às palavras cantadas na língua original. Mesmo que você não entenda uma só expressão
do que é dito naquela língua, a pronúncia naturalmente gutural do hebraico dá
um tom mais dramático e sentido à música.
Não precisa compreender seus significados linguísticos para a sentir. Parece estar rasgando de dentro para fora o
coração. A dor é sincera, é universal, é
humana.
Jerusalém é
cidade velha que se renova, é a cidade santa, é de ouro. Ali Davi marcou seu triunfo como rei. Por ela santos suspiraram. Outros conspiraram. Ali a morte foi vencida. A esperança restaurada.
Na canção de
Naomi Shemer, é como se o Salmo 122:7-8 estivesse respondido em cada nota.
Obrigado pelo esclarecimento!
ResponderExcluirPor nada, querido
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