terça-feira, 29 de julho de 2014

Ética e Estética na Teologia Bíblica do Antigo Testamento

Desde muito cedo o texto do Antigo Testamento – AT tem sido usado pela Igreja Cristã como material sagrado.  A Igreja Primitiva leu o texto do AT como sendo referência sagrada.  Os Pais da Igreja deram a ele valor igual aos escritos provenientes dos apóstolos.  E o Concílio de Trento promulgou solenemente que “... seguindo o exemplo dos padres ortodoxos, este sínodo recebe e venera com o mesmo piedoso afeto todos os livros tanto do Novo como do Antigo Testamento, visto que um só Deus é o seu autor”.
Modernamente o interesse pela leitura do AT tem sido retomado por biblicistas e cristãos em geral que buscam no texto verdades reveladas que tanto desvendem algo mais do que conhecemos acerca de Deus, como indicativos novos de ligação entre ambos os Testamentos e entre eles e a nossa vida moderna.  Contudo todos ainda continuam concordando que esta tarefa nem é fácil e nem se pode dizer que está concluída.  Certamente o AT ainda haverá de descortinar-se para nós em verdades e belezas que até então permanecem a ser descobertas.
Na tentativa de compreender melhor o AT trabalhamos no intuito de conhecer-lhe o que tem de realmente significativo e central no texto, e que por isto pode se mostrar como o fio condutor de todo o cânon, que engloba e alinhava todo o material dando-lhe um sentido unificador.  Assim pretendemos nos enveredar pelos caminhos de uma Teologia que seja realmente bíblica e por isto fiel a todo o AT, bem como o coloque no seu verdadeiro lugar dentro das referências sagradas da religião cristã.
R.E. Clements no seu trabalho O Mundo do Israel Antigo faz uma análise antropológica da relação entre santidade e culto.  A partir de trabalhos dos clássicos teóricos da antropologia – como E. Durkheim – ele apresenta a tese de que, mesmo em seus lugares distintos, no culto no AT todos têm padrões socialmente aceitos para seguir e é exatamente isto que faz do culto o elemento unificador do antigo Israel.  Este trabalho sugeriria então um suporte teórico para a observação do culto vétero-testamentário como constituindo este elemento catalisador de toda a Teologia Bíblica do AT.
Conclusão –
Percorrendo as páginas do Antigo Testamento em busca do que ele realmente significaria para nós cristãos hoje, em busca do seu centro unificador que aponta para dimensões futuras na Revelação de Deus a nós; fomos levados a observar o culto em Israel como sendo o elemento que traz para si toda a carga teológica do texto do AT.  O culto como realizado e visto teologicamente no AT expressa-se dialeticamente como manifestação da ética e da estética que permeiam todo o AT e que reluzem a partir da vida do povo como sendo realmente o centro de onde parte toda a sua existência.
É assim que para nós, que continuamos a ler o AT como quem busca inspiração para a suas vidas, as manifestações cúlticas desafiam-nos a uma relação de compromisso ético e de fervor estético na nossa liturgia cristã, como expressão do verdadeiro culto a este Deus que, tendo “antigamente, por meio dos profetas, falado muitas vezes e de muitas maneiras aos nossos antepassados, mas nestes últimos tempos ele nos falou por meio do seu Filho” (Hb 1:1-2).


sexta-feira, 25 de julho de 2014

TRIBUTO A RUBEM ALVES

Os noticiários nos trouxeram a informação: morreu nesse sábado (19), às 11h50, o escritor e educador Rubem Alves (www.brasil.gov.br).  Nota fria.  Seguiram-se os tradicionais e merecidos obituários, falas de expoentes da cultura e da religião no Brasil e citações diversas.
Quanto a mim, eu não o conheci pessoalmente e nem entendo que há algo que, a esta altura, possa ser dito além do já citado.  Mas para não deixar passar a ocasião, vão aqui algumas linhas.
Assumo.  Mesmo sem contato pessoal, recebi influência significativa de suas obras e ideias.  Fui apresentado ao universo de Rubem Alves quando ainda era um estudante calouro de teologia no Recife (então tinha meus 17 anos).  Todo veterano lia O Enigma da Religião e o discutia, e poder comentá-lo era como uma senha para adentrar naquele mundo.  Li.  E dali emendei logo: O que é Religião?; Dogmatismo e Tolerância; Creio na Ressurreição do Corpo, O Suspiro dos Oprimidos; Filosofia da Ciência – ler nunca foi um problema!
Duas citações deste período inicial merecem destaque: Variações sobre a Vida e a Morte que até hoje tem um lugar reservado em minhas memórias teológicas; e Os Morangos que me foram dados junto com outras publicações infantis por uma amiga muito querida e que, na sua simplicidade, trouxeram-me lições impagáveis – assim penso que era Rubem Alves.
Depois fui conhecendo outras letras, algumas antigas e outras mais recentes: Da Esperança; Tempus Fugit; Pai Nosso; O Retorno Eterno; A Gestação do Futuro; Histórias de Quem Gosta de Ensinar; Poesia Profecia e Magia; O Poeta, o Guerreiro, o Profeta e mais outras tantas.  Além de artigos em revistas e fragmentos espalhados por aí.
Também não posso me esquecer que foi Rubem Alves quem me apresentou a personagens como  H. Cox, L. Feuerbach, F. Nietzsche, S. Kierkegaard, além de boas leituras brasileiras como Clarice Lispector e Guimarães Rosa.
Ainda preciso assumir que, como escrevinhador, seu estilo sempre foi um bom modelo para mim – sei que estou longe de sequer imitá-lo.  Mas confesso que admiro como as palavras lhe fluíam, mesmo desconfiando que nem sempre elas chegaram sem um difícil parto.
E nestas considerações deixo aqui meu reconhecimento que lá na minha gênese teológica e reflexiva Rubem Alves – mesmo sem nunca tê-lo visto – teve sua valiosa contribuição.
Agora ele se foi.  E tenho a ousadia de imaginar que Rubem Alves está no Paraíso adorando o seu Deus lúdico enquanto come caqui e empina pipas.

terça-feira, 22 de julho de 2014

QUEM É DEUS ACIMA DO SENHOR? – conclusão

Depois de algum tempo sem postar, volto hoje para concluir a rápida reflexão sobre: quem é Deus acima do Senhor? a partir da leitura do Salmo 18.  Na 1ª parte entendi que Deus é a Rocha eterna e na 2ª parte que é a torre alta e em ambas que este Senhor é a garantia da vitória em minhas batalhas espirituais.
Agora que já sei disso, quero retomar o estudo refletindo sobre o que ele faz comigo quando estou no calor da luta.  O verso 34 diz: Ele treina as minhas mãos para a batalha e os meus braços para vergar um arco de bronze.
Deus – o Senhor dos Exércitos – é quem me capacita para a batalha!  E isto traz implicações espirituais que me reportam à Bíblia.
Em primeiro lugar, o próprio Senhor é quem capacita aqueles que chama (Jo 15:16 mostra a iniciativa divina).  É claro que uma mulher ou homem bem preparado pode ser uma bênção fantástica nas mãos do Senhor; mas a verdade é que sempre Deus adestra o guerreiro preparando-o para a batalha.  É isso que ele faz conosco.
Uma vez tendo escolhido, a capacitação se dá de duas formas: tirando os empecilhos (como foi no caso de Isaías em Is 6:6-7) e providenciando as condições para a execução da missão (a exemplo de Moisés em Êx 4:11-12).  Quando sou chamado para entrar em combate, o meu Deus que é acima de todos os deuses, através de suas ações sobre minha vida me torna apto para enfrentar qualquer adversário.
Duas outras observações importantes ainda podem ser feitas quando penso na capacitação sobrenatural que o Senhor dos senhores providencia para seu povo.  Com base em Jo 20:22 e At 1:8 sei que o Senhor me capacita com o derramar do Espírito Santo sobre minha vida e sobre minha igreja.  Tais habilidades não são somente resultado de treinamento ou esforço humano (seria insuficiente, embora útil): servos e servas do Senhor são capacitados à medida que se tornam cheios do Espírito (confira ainda o Sl 124).
Outra observação é que no processo de capacitação espiritual, Deus me reveste de sua armadura (o texto de Ef 6 a partir do verso 11 mereceria várias reflexões à parte).  Já que minha luta não é contra carne nem sangue, então os apetrechos de batalha não podem ser deste nível.  Por isso, Deus não somente torna minhas mãos ágeis, mas também providencia armamento adequado para a guerra.  Da mesma maneira que devo me encher do Espírito para poder guerrear contra o mal, devo também me fazer valer das armas que ele coloca à minha disposição: uma completa armadura cristã.
Num contexto de batalha espiritual no qual estamos vivendo, como fomos levados a entender a partir da leitura do Salmo 18, concluo que é indispensável saber quem é o Deus: rocha forme, que sempre vai à minha frente enfrentando toda sorte de inimigos espirituais.  E com esta confiança e determinação seguir rumo a vitória, crente e seguro na capacitação que ele me dá.  Para a única e absoluta glória dele.

(Publiquei esta reflexão pela primeira vez na página ibsolnascente.blogspot.com em 23/07/2010 – a imagem lá em cima é reprodução de uma gravura do francês Jean-Baptiste Debret do século XIX)