Habitando uma área limite entre o adorno puro e a
adequação social, a gravata em si é uma coisa completamente desnecessária, do
ponto de vista prático. Como peça de
vestuário, não cobre nada que já não esteja coberto e, como recurso, também
nada acrescenta (talvez psicológico!) às capacidades que eu já não as tenha
(não falo melhor porque estou com ou sem gravata!).
Quanto a sua origem, consta que a gravata, este
pedaço de pano que se amarra no pescoço, chegou à moda e à indumentária
ocidental lá pelo século XVII, quando militares franceses viram os croatas com
aquelas peças, gostaram e adotaram. Daí
não saiu mais. Mas veja bem, algo que
esteja entre nós há tanto tempo não pode ser simplesmente relegado à
inutilidade. Ninguém sobrevive tanto se
não estampar algum significado!
Vamos a gravata como parábola. Como disso lá em cima, ela está situada
naquele lugar eminentemente humano do limite, da margem, do equilíbrio entre
possibilidades distintas. E isto começa
pela constatação de que gravatas não são unanimidades. Enquanto alguns as têm como peça cotidiana
(por opção ou por necessidade profissional), para outros, só a simples menção
da possibilidade de ter que usar, já se é um problema...
Nós humanos somos assim: vivemos saltitando todo
dia entre a necessidade escolhida e a liberdade imposta. Sempre é difícil fazer escolhas! (Se o seu
caso é ter de usar e só dispor daquela no armário, sem dúvida você não se
encaixa neste paradigma, mas, em geral não é este o caso).
Ora, pensando em gravatas, escolhê-las requer
sempre uma certa dose de arte, bom gosto, intuição e técnica. Por isso ela pode muito bem ilustrar o ser
humano como alguém diante de possibilidades.
Uma bela gravata pode dar um toque de peculiaridade
e distinção em trajes muitas vezes sisudos; mas pode tornar uma composição mais
leve, suave e alegre. Em boa parte das
vezes é somente no uso da gravata que o estilo pessoal é demonstrado. No seu colorido, estampas ou textura está
toda uma gama de possíveis variações individuais.
Mas a situação é limite...
Sem o devido cuidado, a peça no pescoço torna-se
ostentação e arrogância. O que era para
ser simples adereço, escorrega além do limite e descamba com facilidade para a
vaidade. A distinção torna-se
arrogante e pedante.
Mas além de pessoal, a gravata é coisa que só existe
no mundo social, pois o seu uso naturalmente contradiz a intimidade. Veja que tirá-la parece sempre indicar: estou
em casa... Neste sentido a escolha
de uma boa gravata pode indicar garbo, finura, elegância e até nobreza. Sempre situações de reconhecimento e
aprovação social.
Mas continuamos na situação limite....
Forçando um pouco a situação, a aprovação
transfigura-se em imposição e anulação.
A gravata já não demonstra qualidades ou individualidades. Meu currículo fica pendurado no pescoço: eu uso gravata! Assim me anulo completamente enquanto
indivíduo para assumir o papel que me é imposto ao adotar a indumentária de
reconhecimento público e social.
Isso tudo só complica a decisão: eu uso ou não a gravata? Se vou usá-la, como e qual escolher? Uma vez com ela, que mensagem estou
transmitindo? É intencional?
Vou parar por aqui.
Ainda bem que meu Jesus não usou gravata... Então que ele me ajude a viver nesta vida,
sempre habitando em situações limites, sem que me consuma ou destrua, mas que
me permita ser eu mesmo, para a glória dele.
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TU ÉS DIGNO - Uma leitura de Apocalipse
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