terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

SOBRE O PLURAL DE MAJESTADE

 


Vamos olhar o texto e pensar teologicamente um pouco:

 

Sobre o plural de majestade, esse conceito latino do uso do verbo no plural é bem aceito por alguns exegetas.  Mas também é preciso tomar cuidado aqui pois o verbo אמר (dizer – disse) usado no verso de Gn 1:26 e em todo o capítulo, mesmo se referindo ao Deus majestoso, está no singular.  Da mesma forma o verbo ברא (criar – criou) no verso Gn 1:1.

É interessante também observar que esse fraseado plural só é encontrado aqui no texto Hebraico do AT.

 

Em relação ao conceito de Trindade aplicado à expressão do verso 26.  Embora eu creia na doutrina cristã que expressa um Deus manifestado em Três Pessoas (e há bons textos bíblicos que apontem nessa direção), mas vê-lo aqui é um pouco forçado.

 

Talvez a resposta mais simples seja a melhor (como sempre em Teologia!): na forma poética do texto bíblico, o autor evita um imperativo singular – a Deus não se dá ordem, nem como recurso literário – então preferiu uma flexão plural em primeira pessoa para indicar a disposição divina em moldar o ser humano. 

O Criador nos fez de modo singular e proposital para o louvor de sua glória (posso alinhar minha compreensão aqui a Ef 1:12 e Is 44:7).  Uma tradução moderna que talvez consiga expressar melhor esse conceito plural/singular seja em língua inglesa: “Let us make ...”

 

 

Para enriquecer sua compreensão do tema, permita-me duas outras sugestões de leitura:

 

DEUS É UMA UNIDADE COMPOSTA?
Num post aqui no Escrevinhando, com base em Dt 6:4, faço uma análise teológica/exegética da divindade cristã que se apresenta ao mesmo tempo como três e como um – acesse o link

 

No meu livro ENSAIOS TEOLÓGICOS há um artigo sobre O Nome de Deus e o Culto do Antigo Testamento que tangencia esse tema.  Pode ajudar na compreensão – ele está disponível no Amazonlink

 

terça-feira, 11 de fevereiro de 2025

ENDIREITAI O CAMINHO

Em toda palavra profética, junto à denúncia do pecado perante Deus, vem também uma palavra que aponta para conforto e esperança. O objetivo divino em ordenar sua palavra aos profetas, nunca é apenas se vingar ou castigar o povo derramando sua ira, mas é os chamar ao arrependimento, trazendo-os de volta à comunhão.

Assim também foi com a profecia de Jeremias. Ele denunciou o quadro triste em que o povo vivia, mas, mesmo aqui, uma palavra de chamada ao retorno ficaria evidente:

“Assim diz o SENHOR dos Exércitos, o Deus de Israel: Endireitai os vossos caminhos e as vossas ações, e vos farei habitar neste lugar” (7.3). Esse sempre foi o objetivo do Senhor ao enviar seus profetas: fazer com que o povo tivesse oportunidade de corrigir suas rotas e se voltarem para ele.

Certamente o castigo pelo pecado é a sua consequência inevitável. Sempre haverá, contudo, uma promessa que acompanha à sentença: “pois assim diz o SENHOR: Toda esta terra ficará destruída; mas não a consumirei totalmente (4.27).

Mas nessa relação de anúncio profético, castigo e esperança, algumas condições deveriam ser observadas.

Começando pela sinceridade do coração. Se a palavra do profeta é sempre um chamado ao arrependimento e à volta ao Senhor, esse movimento não pode ser feito com falsidade. Por isso o chamado é sempre para que haja um coração verdadeiro e sem fingimento diante de Senhor (3.9,10) e nem falsidade nas palavras (5.2). Ou seja, que a verdadeira aliança aconteça nos corações e não apenas como ritual exterior (4.4).

Então, como isso deverá acontecer? Eis a relação de atitudes que são requeridas pelo Senhor: “Mas se de fato endireitardes os vossos caminhos e as vossas ações; se realmente praticardes a justiça entre um homem e o seu próximo; se não oprimirdes o estrangeiro, o órfão e a viúva, nem derramardes sangue inocente neste lugar, nem seguirdes outros deuses para vosso próprio mal, então eu vos farei habitar neste lugar (7.5-7).

Deus continua tendo interesse em atrair e corrigir seu povo. Nunca foi a vontade do Senhor apenas derramar sua ira como um ato punitivo e vingativo. Ele é amor e isso deve estar sempre presente nas palavras proféticas.

 

(A partir da revista “COMPROMISSO” – Convicção Editora – Ano CXVII – nº 468)

  

No mesmo tema, sugiro ampliar sua leitura no artigo “Por que Deus dá a profecia?” onde eu concluo que “Deus dá a profecia para que o mundo – criação conjunta de Deus e seres humanos – possa não ser abandonado à sorte do tem de ser, mas que possa ser vislumbrado sob a ótica do pode ser.”  Acesse no Escrevinhando no link.

 

terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

TOMÁS DE AQUINO – a imagem e a moeda

 


Um colega, aqui conversando aqui comigo, via zap, fez uma citação do mestre Tomás de Aquino quando o teólogo apresentou uma analogia entre a imagem de Deus e a moeda romana com a imagem de César.

Na conversa, ofereci uma reposta para manter o diálogo, mas depois fiquei com o assunto na cabeça.  Tenho pesquisado sobre o tema, pois pretendo escrever um livro sobre os capítulos iniciais da Bíblia.

Então aqui vai um misto do que eu respondi no zap com algo que pesquisei depois.

 

Antes.  Sobre o pensador.  Tomás de Aquino foi um filósofo/teólogo da Escolástica católica que viveu e escreveu no século XIII na região de Aquino – centro da Itália.  Sua abordagem filosófica foi de linha aristotélica e tratava a própria Teologia como uma ciência.

 

Quanto a citação de Tomás de Aquino, o que achei nas minhas pesquisas, folheando a “Suma Teológica” (a edição que uso aqui tem mais de quatro mil páginas) diz ipsis litteris:

 

 “Tanto no homem como na mulher está a imagem de Deus, quanto a aquilo em que, principalmente, consiste a essência da imagem, a saber, a natureza racional” (Questão 93 – art. 4).

“Diz-se que o homem é a imagem de Deus, não por ser essencialmente imagem, mas por trazer no espírito impressa tal imagem; assim como se diz que a moeda é a imagem de Cesar, por ter a imagem deste. Por onde, não é necessário introduzir a imagem de Deus em qualquer parte do homem” (Questão 93 – art. 6).

 

Aproveitando a pesquisa: encontrei no site do Vaticano:

 

Em Tomás de Aquino, a imago Dei possui uma natureza histórica, enquanto passa por três fases: a imago creationis (naturae), a imago recreationis (gratiae) e a imago similitudinis (gloriae) (S. Th. I q. 93 a. 4). Para o Aquinatense, a imago Dei é o fundamento da participação na vida divina. A imagem de Deus se realiza principalmente em um ato de contemplação no intelecto (S. Th. I q. 93 a.4 e 7).

 

Minhas considerações a partir do argumento do teólogo latino:

 

A analogia de Tomás de Aquino, comparando uma moeda com a imagem de Deus (Imago Dei em latim como usou o teólogo italiano), pode enriquecer bastante a compreensão – embora seja uma exegese tardia.

Porém, não penso que o autor bíblico tivesse com tal analogia em mente quando escreveu as palavras sagradas.  Pelo contexto geral, talvez a melhor analogia seria com as esculturas de divindades dos povos ao redor que exibiam a imagem de seus deuses, enquanto que a imagem do Elohim Criador (יעש אלהים – expresso em Gn 1:7) estaria impressa na sua obra prima: o ser humano.

Lendo mais o texto de Gênesis, observo que em Gn 5:3 novamente o termo hebraico צלם (imagem) é usado junto com דמות (semelhança/modelo) para se referir ao filho gerado por Adão.  Neste caso a analogia da moeda perde mais paridade ainda.  Novamente consigo entender que o autor bíblico tem em mente a reprodução da imagem e semelhança viva (Adão gerou outra vida!) em um outro ser.

 

Em resumo, em minha Teologia, leio o poema sagrado do Gêneses querendo comparar a feitura do ser humano com os contornos divinos dando-lhe atributos que espelhassem o Criador.

 

E antes de finalizar, mais uma citação.  Dessa vez de Esteban Voth e Milton Acosta Benitez no “Comentário Bíblico Latino-Americano”:

 

 “Sugerimos que a imagem de Deus nos fala da capacidade que temos para nos relacionar com Deus.  Deus nos estampou algo que permite a ele estabelecer conosco uma relação íntima, por meio de comunicação verbal, alianças etc.”

 

(Na imagem lá em cima, uma reprodução de uma moeda romana estampada a face do Imperador Tibério – 14-37 A.D.  Fonte:  wikipedia.org)

 

terça-feira, 28 de janeiro de 2025

A igreja de Cristo vivendo a unidade do Espírito – 3ª parte


 

A IGREJA DE CRISTO VIVENDO A UNIDADE DO ESPÍRITO –
" eu vi uma grande multidão de todas as nações e língua. E clamavam dizendo: Amém. Louvor, glória, sabedoria, ações de graças, honra, poder e força ao nosso Deus, para todo sempre. Amém." Ap 7:9-12  
3ª parte da reflexão por ocasião do aniversário da PIBAF - Sergipe

 

Assista as três partes dessa reflexão no YouTube –

 1ª. Parte

2ª. Parte

3ª. Parte

 

#reflexãobíblica #igreja #cristianismo #pregação #mensagem



sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

A igreja de Cristo vivendo a unidade do Espírito – 2a. parte


 

A IGREJA DE CRISTO VIVENDO A UNIDADE DO ESPÍRITO
" e ELE distribui dons aos homens."
Efésios 4:1-6
2ª parte da reflexão por ocasião do aniversário da PIBAF - Sergipe

Assista as três partes dessa reflexão no YouTube –

1ª. Parte

2ª. Parte

3ª. Parte

 

#reflexãobíblica #igreja #cristianismo #pregação #mensagem


quarta-feira, 22 de janeiro de 2025

A igreja de Cristo vivendo a unidade do Espírito - 1a. parte


A IGREJA DE CRISTO VIVENDO A UNIDADE DO ESPÍRITO

Efésios 4:1-6 / Mateus 6:25-34

1ª parte da reflexão por ocasião do aniversário da PIBAF - Sergipe


Assista as três partes dessa reflexão no YouTube –

1ª. Parte

2ª. Parte

3ª. Parte

 

#reflexãobíblica #igreja #cristianismo #pregação #mensagem 



terça-feira, 14 de janeiro de 2025

UMA CORDA PARA O SACERDOTE

 


Sobre o tema da corda amarrada ao sacerdote no momento em que ele entraria para ministrar, a resposta rápida e direta é simples: isso é lenda.  Não está na Bíblia.

 

Mas, aproveitando a oportunidade do tema, vamos aprofundar um pouco sobre o assunto – isso é possível fazer olhando por dois ângulos:

 

O primeiro ângulo é bíblico (o mais importante):

 

Como disse, não está na Bíblia nenhuma instrução ou narração que cite tal prática.  Ou seja, não tenho como lhe indicar nenhum versículo nessa direção.

Ainda assim, é interessante olhar as páginas sagradas e procurar indicações que, pelo menos, possam tangenciar o assunto: santidade no altar.

A afirmação bíblica é categórica: “O Senhor é Santo!” (absolutamente santo – observe Is 6:3 e Ap 4:8).  E o próprio Deus se apresenta em santidade, exigindo uma contrarresposta também de santidade (considere Lv 11:44 e 1Pe 1:15-16)

Sendo assim, todo movimento de culto e adoração deveria expressar essa santidade.

 

Observe mais:

Nas instruções de culto na antiga aliança, uma vez por ano, no dia da expiação, o sumo sacerdote deveria entrar no lugar santíssimo – o santo dos santos – e oferecer uma oferta específica pelos pecados do povo (instruído em Lv 16).  E, importante, havia regras especificas de comportamento sacerdotal para que cumprisse tal ritual.

No contexto, o episódio dos filhos do sacerdote Arão – Nadabe e Abiú – ofereceram fogo estranho no altar e o fogo os consumiu de imediato (a história está descrita em Lv 10).  O detalhe a se considerar nessa passagem é que aqui se passa no pátio externo do tabernáculo e o fogo referido é do incenso, e não no santíssimo nem com o fogo sagrado.

E não há sequer citação de corda.

No Novo Testamento, no episódio do anúncio feito pelo anjo ao sacerdote Zacarias (a história está em Lc 1:5-25), o sacerdote se demorou no interior no santuário e o povo, do lado de fora, apenas ficou à espera.  Também sem referência a corda alguma.

 

Um outro ângulo que podemos mirar o tema é do ponto de vista do mito, da narrativa e da história:

 

É verdade que o povo judeu sempre foi muito dado a lendas, mitos e tradições alheias à Bíblia.  E entre elas está a narração de que uma corda seria amarrada ao sacerdote no momento em que ele entrasse para ministrar, porque, se ele morresse ali poderia ser retirado. 

E essa lenda ganhou variações, a corda já foi amarrada no tornozelo ou na cintura, e já foi de couro, de ferro ou de ouro... e por vai...

Então essa história foi sendo contada e recontada até que, no século 13, judeus espanhóis consolidaram o mito passando a narrar como se fosse verdade.  E daí ficou...

 

Ainda, na descrição antiga, a roupa do sacerdote tinha penduricalhos, tipo sinos, que chacoalhavam enquanto ele se movimentava e adicionavam sons festivos à cerimônia (em Ex 28:33-34).  Talvez tenha sido daí a origem da lenda.  E só.

 

Voltando a verdade espiritual que a nova aliança nos trouxe em Jesus Cristo.  A vontade explícita de Deus é a nossa santificação (1Ts 4:3).  O autor aos Hebreus nos garante, contudo, que podemos comparecer santificados diante de Deus, uma vez que Cristo, sumo-sacerdote perfeito, se ofereceu a si mesmo como oferta por nossa redenção (leia o argumento em Hb 9).