sexta-feira, 5 de junho de 2020

OITO DIAS DEPOIS

Tomé, apelidado de Dídimo, ficou conhecido como o apóstolo que duvidou.  Sobre ele, não são muitas as citações nos Evangelhos.  Por isso também dali não se poder extrair muita informação.

Nos sinóticos Tomé só aparece citado junto a relação dos doze e João faz referência a ele em quatro ocasiões apenas: na cena da ressurreição de Lázaro (em 11:16), quando pergunta pelo caminho (em 14:5), no episódio da dúvida (de onde vem a sua fama - em 20:24-29) e na pesca maravilhosa (em 21:2).

Mas, antes de questionar sua dúvida, vamos notar a sua ausência.  João diz que já pela tarde daquele dia da ressurreição - o primeiro da semana - Jesus apareceu aos seus discípulos que estavam trancados, com medo.  Naquela reunião Tomé não estava presente.

Com os corações já mais aliviados, os discípulos encontraram depois Tomé e lhe contaram o que tinha se passado naquele encontro com Jesus.  E a atitude de Tomé foi razoável: se eu não ver e tocar...

 

OITO DIAS DEPOIS

 

João então vai nos dizer que oito dias depois - ou seja, no primeiro dia da semana seguinte (dia que passamos a chamar de domingo) - Jesus novamente veio se encontrar com seus discípulos, e agora Tomé estava presente.

Aqui então eu quero me imaginar sentado naquela sala e observando a cena, as circunstâncias e os personagens.  Peço que me deem essa liberdade.

Vai ser interessante.  Sente-se ao meu lado.

O ambiente já era diferente da semana anterior.  Oito dias tinham se passado desde que eles viram Jesus ressurreto.  Agora a conversa já fluía mais amena, o clima mudara de temor para expectativa da presença, e disfarçado era até possível perceber algum sorriso insistente: o Senhor vive.

Lá num canto, Tomé desconfiado aguardava em silêncio para ver o que aconteceria.

— Será!?

Quantas ideias fervilhavam na sua cabeça? Quantas outras dúvidas razoáveis? Quantas lembranças e possibilidades?

Mais um detalhe me chama a atenção.  Não há registro de repreensão dos colegas de discipulado ao duvidoso Tomé.  Não há reprimenda, nem julgamento, nem exclusão.

Ali todos sabiam que em um outro momento fraquejaram, duvidaram e se esconderam.  Nenhum tinha moral alguma para cobrar nada daquele que esteve ausente oito dias antes.

E eu começo a me sentir em casa nesse salão.  Onde todos sabem e assumem suas fraquezas, cria-se um lugar de perdão e acolhimento.

Tomé duvidou, Pedro negou, Judas traiu.  Houve medo é covardia.  Mas todos os que quiseram voltar à comunhão foram bem vindos.

Assim estava se formando a igreja de Cristo.  E nessa nascente comunidade não havia nem juízes nem algozes, apenas companheiros de caminhada: pecadores arrependidos alcançados pela graça inexplicável da Cruz.

E foi então nesse ambiente e aconchego que Jesus chegou novamente.  Deus gosta desse tipo de gente e lugar (o Sl 51:17 já cantava isso).

Eu, lá no outro canto, apenas observo que Jesus, ao aparecer, depois da saudação habitual e coletiva, vai ao encontro em particular de Tomé.  Sua voz é mansa e agradável.  Ele não cobra ou lança em rosto (Acusador é o Outro!).

— Filho olhe para mim e me toque.  Sou eu mesmo.  Estou vivo e eu vim aqui para conversarmos.  Para mim você não é o covarde, é o alvo do meu amor eterno.

Então, oito dias depois de deixar o túmulo vazio, Jesus recebeu a rendição prostrada de um discípulo amado: Meu Senhor! Meu Deus!.

E minha vontade agora é apenas me juntar a Tomé nessa adoração.

 


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