Nos sinóticos Tomé só aparece citado junto a relação dos doze e João faz referência a ele em quatro ocasiões apenas: na cena da ressurreição de Lázaro (em 11:16), quando pergunta pelo caminho (em 14:5), no episódio da dúvida (de onde vem a sua fama - em 20:24-29) e na pesca maravilhosa (em 21:2).
Mas, antes de questionar sua dúvida, vamos notar a sua ausência. João diz que já pela tarde daquele dia da ressurreição - o primeiro da semana - Jesus apareceu aos seus discípulos que estavam trancados, com medo. Naquela reunião Tomé não estava presente.
Com os corações já mais aliviados, os discípulos encontraram depois Tomé e lhe contaram o que tinha se passado naquele encontro com Jesus. E a atitude de Tomé foi razoável: se eu não ver e tocar...
OITO DIAS DEPOIS
João então vai nos dizer que oito dias depois - ou seja, no primeiro dia da semana seguinte (dia que passamos a chamar de domingo) - Jesus novamente veio se encontrar com seus discípulos, e agora Tomé estava presente.
Aqui então eu quero me imaginar sentado naquela sala e observando a cena, as circunstâncias e os personagens. Peço que me deem essa liberdade.
Vai ser interessante. Sente-se ao meu lado.
O ambiente já era diferente da semana anterior. Oito dias tinham se passado desde que eles viram Jesus ressurreto. Agora a conversa já fluía mais amena, o clima mudara de temor para expectativa da presença, e disfarçado era até possível perceber algum sorriso insistente: o Senhor vive.
Lá num canto, Tomé desconfiado aguardava em silêncio para ver o que aconteceria.
— Será!?
Quantas ideias fervilhavam na sua cabeça? Quantas outras dúvidas razoáveis? Quantas lembranças e possibilidades?
Mais um detalhe me chama a atenção. Não há registro de repreensão dos colegas de discipulado ao duvidoso Tomé. Não há reprimenda, nem julgamento, nem exclusão.
Ali todos sabiam que em um outro momento fraquejaram, duvidaram e se esconderam. Nenhum tinha moral alguma para cobrar nada daquele que esteve ausente oito dias antes.
E eu começo a me sentir em casa nesse salão. Onde todos sabem e assumem suas fraquezas, cria-se um lugar de perdão e acolhimento.
Tomé duvidou, Pedro negou, Judas traiu. Houve medo é covardia. Mas todos os que quiseram voltar à comunhão foram bem vindos.
Assim estava se formando a igreja de Cristo. E nessa nascente comunidade não havia nem juízes nem algozes, apenas companheiros de caminhada: pecadores arrependidos alcançados pela graça inexplicável da Cruz.
E foi então nesse ambiente e aconchego que Jesus chegou novamente. Deus gosta desse tipo de gente e lugar (o Sl 51:17 já cantava isso).
Eu, lá no outro canto, apenas observo que Jesus, ao aparecer, depois da saudação habitual e coletiva, vai ao encontro em particular de Tomé. Sua voz é mansa e agradável. Ele não cobra ou lança em rosto (Acusador é o Outro!).
— Filho olhe para mim e me toque. Sou eu mesmo. Estou vivo e eu vim aqui para conversarmos. Para mim você não é o covarde, é o alvo do meu amor eterno.
Então, oito dias depois de deixar o túmulo vazio, Jesus recebeu a rendição prostrada de um discípulo amado: Meu Senhor! Meu Deus!.
E minha vontade agora é apenas me juntar a Tomé nessa adoração.
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