terça-feira, 10 de março de 2020

A PALAVRA FEZ-SE CARNE


O Evangelho de João começa com uma firmação categórica: No princípio era o Verbo (Jo 1:1).  E deixe-me logo dizer que penso que, de maneira proposital, João apontou para o primeiro verso da Bíblia: No princípio criou Deus (Gn 1:1).
Tudo começa com o Verbo.  Nada havia antes dele e tudo só existe a partir dele.  Ele é o princípio de todas as coisas.  E é João que não deixa dúvidas sobre quem é o Verbo: Jesus (leia 1:17).
Assim João pode começar seu Evangelho:  Jesus é o Verbo de Deus.  E tudo o que ele vai contar e refletir tem que manter este pressuposto bem firmado.  Mas antes vamos entender um pouco o que significa esta expressão: O Verbo.
A palavra em língua grega que João usa é Λόγος (Logos).  O termo era bem conhecido tanto de gregos como de hebreus na época do Evangelho.  A tradução usual que damos a este termo em português é Verbo.  Mas talvez isto não nos diga muito.  Entendo que uma tradução mais livre como Palavra seria melhor:
No princípio era a Palavra ... e a Palavra fez-se carne (Jo 1:1 e 14).
No primeiro século, intelectuais usavam este termo para se referir ao princípio teórico básico – ou conceito filosófico – que fundamentava toda a existência e seria através dela que as divindades se comunicariam com a humanidade.
Para João este conceito é pobre.  Ele vai além.  A Palavra é mais que um postulado teórico filosófico, é o próprio Deus que criou o mundo e se relaciona pessoalmente com homens e mulheres.
Não uma espécie de deus ou derivado qualquer da divindade, também não é uma aparência ou conceito metafísico.  É o próprio Deus em sua essência e plenitude.
E esta Palavra é Jesus.  João não tem nenhuma dúvida quanto a isso.  O que poderá ser observado não somente neste prólogo ao Evangelho, mas também ao logo do seu transcorrer.  Para demonstrar, confira ainda a expressão tirada da boca do próprio Cristo: Eu e o Pai somos um (Jo 10:30), e a confissão de Tomé: Deus meu (Jo 20:28).
Aprofundemos nesse conceito: A Palavra eterna e pré-existente tinha um propósito, e o cumpriu fazendo-se carne (Jo 1:14).
É verdade que ninguém pode ver Deus – aqui o Evangelho cita Moisés (compare Jo 1:18 com Ex 33:20).  Contudo, a Palavra apresentada no Evangelho de João é a expressão admirável da glória divina (1:14) e a revelação perfeita e absoluta de Deus (1:18).
Ou seja, embora seja verdade que a Palavra eterna seja Deus – e isso é essencial tanto para a fé com cristã em geral, quanto para o Evangelho em especial – mas o que João intenta demonstrar com seu texto é o Deus-Palavra que entrou na história humana.  O sublime se fez carne.  O eterno, temporal. 
E o fez por vontade própria, ao contrário do mundo que foi criado (compare os versos 3 e 14 onde João usa mesma expressão: fez-se para demonstrar a essencial diferença entre Criador e criatura).
Assim, um aspecto a se destacar na encarnação da Palavra divina é a compreensão de que ao se fazer carne, Jesus Cristo tornou-se completa e perfeitamente humano.  Ele não somente revela toda a divindade, com também assume toda a humanidade.  É um com Deus e torna-se um de nós.
Assim, desde o seu começo, João nos apresenta um Evangelho que procura refletir sobre a vida e história de Cristo, mais que apenas narrar seus episódios.  Ele inicia apresentando a Palavra divina e eterna, mas que se fez carne com o objetivo de revelar a luz e glória de Deus e de nos atrair para ser seus filhos.
Que possamos assim crer nele para fazer parte da família de Deus como filhos e desfrutar da graça e glória divina através de Jesus Cristo.

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